Sol - Procissão do Corpo de deus - S. Gonçalo - Amarante
Fotografia de Anabela Matias de Magalhães
A Língua Portuguesa é, para nós falantes dela, apenas basilar e estruturante de todo o pensamento e de todo o conhecimento. Pensamos em português, falamos em português, esta é a língua que utilizamos para comunicar desde que nascemos, ainda antes, para ser mais precisa, e é através dela que chegamos ao conhecimento seja do que for pois ela está sempre presente no nosso dia-a-dia, nas aprendizagens que fazemos no recato do nosso lar, nos espaços de convívio com os nossos pares e com os ímpares também, na escola, obviamente, onde ela está omnipresente. É através dela que estruturamos o nosso pensamento e o nosso conhecimento, descodificamos e formulamos mensagens. Ou não.
Deparo-me, enquanto portuguesa, com um péssimo uso da Nossa Língua Materna e não me estou só a referir aos estratos sociais, económicos e culturais mais baixos da nossa sociedade. A cada passo detecto erros ortográficos na legendagem de filmes, na "legendagem" dos noticiários, que mania de pôr aquela tira horrorosa que nos tapa o fundo do écran e nos dispersa a atenção para outras notícias que não a que está a ser dada!, até nos manuais escolares já para não falar nos pontapés de gramática dados por muitos dos nossos "governantes" que escrevem qualquer coisa que não português e cujo exemplar máximo é/foi, sem dúvida, a Directora Regional da Educação do Norte, Margarida Moreira de seu nome, que por certo todo o país fixou, dado o escândalo da coisa.
A Língua Portuguesa comanda-nos as aprendizagens em todas as áreas do Saber. Se eu não conseguir descodificar uma qualquer questão de Matemática ficarei por certo a olhá-la como um boi para um palácio. Se eu ler uma questão num teste de História e compreender o contrário do que me está a ser pedido está bom de ver qual vai ser o resultado final.
Por ter a consciência da importância da Língua Portuguesa e das debilidades sentidas pelos alunos neste domínio, quando estes me chegam à sala de aula no 7º ano de escolaridade, qual o papel que escolhi para mim, enquanto professora de História e de Língua Portuguesa?
Ficar a barafustar com os meus alunos porque os erros ortográficos assim e as construções frásicas assado? Ai meus deuses, ai meus deuses que isto é inacreditável!
Pois, também barafusto mas, para além disso, exijo-lhes um português escorreito, frases completas nos exercícios e nos testes, portefólios, que já foram cadernos em tempos que já lá vão, ordenados e que são vistoriados por mim, de quando em vez, exaustivamente, fazendo a sinalização dos erros ortográficos que os alunos têm de corrigir dez vezes, das faltas de acentos, que os alunos têm de corrigir cinco vezes e a mesma coisa para os sumários inventados e que não correspondem minimamente ao que eu ditei e que por vezes me deixam verdadeiramente estupefacta perante a criatividade das criaturas.
Este meu trabalho enquanto docente, de portefólios à tiracolo que arrasto para a sala de professores ou mesmo para minha casa, num trabalho imenso que eu não sou obrigada a fazer mas faço por entender ser benéfico para os alunos, já foi alvo de gozos infindáveis por parte de outros meus colegas de profissão porque sim, eu ganho exactamente o mesmo que outros nas minhas circunstâncias e sim não tenho nada de mais interessante para fazer na vida e sim, contento-me muito e fico muito feliz quando mando os alunos, no início do 3º período, fazerem um exercício muito simples - contarem os erros dos seus portefólios no 1º e no 2º período que anotam no quadro em colunas separadas. No fim é só fazer o que o outro disse, é só fazer as contas e pedir aos alunos para encontrarem uma explicação para a tendência de os erros diminuírem, de um período para o outro, mais de dois terços. E sim, a cabeça deles também foi feita para pensar e lá me ensaiam explicações - Pois, professora, ficamos mais cuidadosos porque sabemos que a seguir temos de corrigir os erros! Pois, professora, mais vale estar mais atento e fazer logo bem à primeira! Pois professora, não queremos o trabalho de corrigir os erros dez vezes.
É claro que eu podia simplesmente barafustar. É evidente que teria muiiiito menos trabalho com isso. É claro que também poderia fazer de conta que cumpro os critérios de avaliação dos alunos apenas a olhar de relance para os portefólios, tirando-lhes as medidas a olhómetro, ora deixa cá ver, sim senhora, está muito giro! A chatice é que acredito que esse é um péssimo caminho e que, por ser de tal qualidade, eu escolhi não ir por aí. Até porque o exemplo dado aos meus alunos seria o da desonestidade e eu também não admito ir por aí.
Ah! E as evidências deste meu trabalho, agora tão em moda, estão aqui.
E sim, tenho um saco deles, um Saco de Portefólios. Obrigada, Lai.
Valha-nos o facto de ainda haver professores.
ResponderEliminarSó gostaria de acrescentar algo que quase toda a gentinha esquece: sem uma linguagem não se pensa.
Vou acrescentar essa ideia ao meu texto, João! Pensei-a e depois esqueci-me...
ResponderEliminarGrata pala ajuda de enriquecimento do meu texto.
A minha rédea curta, que eu uso com os meus alunos, ficou-me da rédea curta que usaram comigo... eheheh...
Rédea muito curta na primária, com correcção de erros e acentos e procura dos sinónimos das palavras desconhecidas. Era um trabalho contínuo que eu também procuro incutir nos meus alunos. Na faculdade fiz uma cadeira com 15 ou 16 e recebi um recado do meu professor para passar pelo seu gabinete. Quando lá cheguei recebi um valente puxão de orelhas... em não sei quantas páginas escritas tinha algures um erro ortográfico, disse-me o professor, inadmissível numa aluna com uma nota destas...
Saí do gabinete envergonhada... muito embora possa acontecer em quem escreve muito e rápido... que por acaso até é o meu caso...
Acredite que muitos docentes de História e Geografia de Portugal aplicam, no segundo ciclo, o mesmo trabalho em prol da boa prática da Língua. Curioso é verificarmos que presentemente os alunos obtêm melhores resultados em Língua Portuguesa do que em HGP, disciplina em muito afectada pela falta de competência dos alunos no uso da Língua que os inibe de uma correcta interpretação e exposição dos assuntos estudados. Todavia, os resultados e progressos demoram a fazer - se sentir.
ResponderEliminarTenho a certeza que sim, Pedro.
ResponderEliminarE bom seria que estas boas práticas fossem implementadas desde o 1º ano de escolaridade, certinho, num trabalho de exigência sem tréguas e de rédea curta pelo menos até ao 9º ano de escolaridade. Depois, acho que talvez já pudessem ficar por conta e risco deles próprios...
Mas, infelizmente, é o que se vê e os alunos chegam-nos às mãos, frequentemente, num estado lamentável a português, a darem erros ortográficos a torto e a direito, a não saberem construir uma frase escorreita... e está a piorar...
Uso este método há muitos anos e este ano deparei-me, pela primeira vez, com alunos que não acabam as palavras e as deixam suspensas...
Relativamente a História do 3º Ciclo passa-se exactamente o mesmo que aponta para o 2º Ciclo... enfim, muitos trabalho há a fazer. Esperemos dias melhores... virão?
Abraço!