Ainda a Propósito da Avaliação do Desempenho
Hoje foi dia de me irritar na escola. Mais concretamente, foi dia de me irritar na sala de professores da ESA. Mas podia ter sido numa outra sala de professores de uma outra escola qualquer deste "jardim" à beira mar plantado. Ou no café aqui da esquina. Ultimamente acontece-me de tempos a tempos, porque já estou sem pachorra, e porque não admito que me tentem ludibriar, atirando-me areia para os olhos, ou que tentem fazer de mim acéfala, como se eu pudesse abdicar do meu espírito crítico e engolisse, cantando, toda a porcaria que me querem colocar no prato e que me querem fazer comer. Ora se há especialista em "areia" é este escorpião azul, que conhece as "dunas" pelas "formas", pelas "cores", diria até pelo "cheiro", porque não nasceu ontem! E a idade da inocência já ficou para trás faz muito, muito tempo. Felizmente!
Pois estava eu e algumas colegas a apontar alguns defeitos a este sistema de avaliação de desempenho, nomeadamente a chamar a atenção para o facto de, segundo este modelo, nalguns aspectos aberrante, eu poder ter aulas assistidas e avaliadas por quem, como eu, concorre às quotas de Muito Bom e de Excelente e que, por ter interesse nessa avaliação, é "bem capaz" de não ter uma visão isenta, quando uma colega minha, alterando a voz, me diz que eu não tenho absolutamente nenhuma razão e que não devemos agarrar-nos a pormenores "menores" da avaliação, e que na nossa classe profissional somos todos EDUCADORES e, como tal, somos TODOS isentos, bons profissionais, justos, rectos, idóneos e outras coisas que tais. Que me desculpem os meus leitores... mas estou mesmo sem pachorra para este tipo de discurso. Já passei há muito a fase das generalizações generalizadas. Perigosas. Se eu salto para a arena quando me dizem que os professores são OS responsáveis pela indisciplina na escola, também salto para a arena quando me dizem que, porque somos educadores, somos todos uns anjinhos que para aqui andamos. Ora se há alguém que se orgulha da profissão que tem, esse alguém sou eu. Se há alguém que trata de valorizar a profissão que tem, no seu dia a dia, dentro e fora da escola, esse alguém sou eu. Se há alguém que a defende com unhas e dentes, esse alguém sou eu. E como eu existem Muitos e Muitas, que a defendem como leões e que a desempenham com amor porque foi o que escolheram ser. Mas não contem comigo para branquear a minha profissão. Não contem comigo para fazer exactamente aquilo que eu condeno e que é varrer sistematicamente a porcaria para baixo do tapete, ou para assobiar para o lado. Calha bem... é que eu nem sei assobiar! E a minha idade da inocência já lá vai. Eu até sou uma optimista por natureza, mas também sou realista. E assim sendo, sei que na minha profissão também existe lixo. Vou repetir e frisar: LIXO. Já o vi. Já falei com ele. A minha filha, enquanto aluna, já o sentiu na pele. Eu, enquanto aluna senti-o na pele. Existe lixo entre os professores tal como existe lixo em todas as classes profissionais deste país e arredores. Existe gente mal formada, gente pequenina, gente vingativa, gente que é uma balda. E sei que esse lixo está disseminado pela categoria de professores, e pela categoria de professores titulares, e pelas direcções executivas das escolas deste país e que abrange professores no topo dos topos da carreira que nisto de lixarada não há espécies imunes. Sei também que felizmente não é a maioria, nem de longe nem de perto. Sei também que a maioria dos docentes faz muitas vezes mais do que aquilo a que está obrigado pela tutela, unicamente por amor à camisola.
Se tenho medo que situações impróprias para consumo se verifiquem aqui e ali nas escolas deste país?
Tenho.
Se tenho receio em ser avaliada pelos meus pares?
Tenho.
Se acredito que todo o processo vai ser limpo, transparente, feito com lisura por toda a gente envolvida, em todas as escolas deste país?
Não acredito.
Estaria a mentir se dissesse o contrário.
E sei do que falo.
Já o senti mais do que uma vez a queimar-me a pele.
Grande crítica, Anabela.
ResponderEliminarDe facto, vive-se na escola um clima de simulacros: simulacro de valores nobres e bons; simulacro de hierarquias e estatutos, simulacro do fazer ou do agir.E pior: simulacro do (saber) pensar.
Há quem tenha um elevado sentido crítico e um déficit de auto-crítica. Há quem vomite verborreia - estratégia de defesa -para se isentar da práxis. Simulacros de Lutadores pela palavra. Inócuos da acção.
Lamento tornar público o motivo pelo qual não sou frequentadora assídua da sala ("central") dos professores: é um "nicho" de intrigas, mediocridades mentais. Claro, não querendo incorrer no erro que criticas, não poderei generalizar esta apreciação à totalidade dos envolvidos.
Incomoda-me o barulho, os gritinhos, as poses, os simulacros de sorrisos, os atropelos (físicos) no bar. Numa palavra, a Falta de Educação. Incomoda-me antecipar que virei a ser assim um dia... talvez quando perder a lucidez e a bengala me acompanhar.
Já tive oportunidade de dizer neste blogue que poucos - muitos poucos - são os professores que conheço amantes/amadores (etimologicamente aqueles que amam)
da sua profissão. São esses os que respeito e admiro. São estes que me fazem pensar que há professores muito bons, evitando que caia no pessimismo radical.
Mas sim, também há quem seja "muito mau". E o mau, para mim, é o antípoda da(s) autenticidade(s): do (falso) Saber, do (falso) Sentir, do (falso)SER.
Obrigada, Elsa, pelo teu apoio, que para mim é muito significativo, relevante e importante.
ResponderEliminarContinuo a recusar ser um simulacro de lutadora pela palavra e inócua na acção, para utilizar as tuas expressões. Já falei por diversas vezes desse assunto neste blogue.
Recuso abastardar-me.
É assim. Começo a ficar preocupado com os professores que amam e vivem a sua profissão e começam a detestar o espaço Escola, a ecologia actual na Educação. A Anabela como pessoa bem formada e informada, que o é, sabe bem do que fala. vejam bem, o maior defeito da Anabela é dizer e escrever o que pensa de forma frontal, mas sempre educada. Ora, num país democrático isso deveria ser salutar; mas não, não o é! Eça de Queirós falou muito desta nossa forma de ser: intriguistas, gostamos de estar bem com Deus e com o Diabo, falsos, mesquinhos... Pois, mas a Anabela não é assim e mexer com a sua dignidade profissional é deixá-la doente. Sei que ela vai doente e amargurada para casa, sempre que ocorrem estes episódeos. A Elsa, outro ser à parte, descreve isso no seu comentário, de forma que eu não consigo fazer por incapacidade literária e cultural. Mas uma coisa eu sei: orgulho-me de vos ter como colegas! Obrigado por serem um exemplo, para mim e não só! Disse.
ResponderEliminarE obrigada também pelo teu apoio, Helder. Eu própria começo a ficar preocupada com os ambientes educativos. Nestas ocasiões sinto-me um peixinho fora de água.
ResponderEliminarA sala de aula continua a ser o sítio onde eu normalmente sou feliz. Os meus alunos continuam a ser quem me segura nesta profissão.
E tu também és um exemplo de colega para mim, sempre pronto a ajudar este ou aquela. No caso, sempre pronto a ajudar-me. Procuro seguir-te o exemplo.
Anabela e Elsa (minha homónima),
ResponderEliminarEstou em crer que quem é vertical nem de bengala passa a dobrar a espinha. Só se for mesmo por efeito senil.
A vossa descrição dessa “floresta de enganos” é-me, infelizmente, muito familiar. Déjà vu? Não!
Também eu já deixei para trás a idade da inocência… E não sendo por natureza, tão optimista como a Anabela, ainda assim dou comigo, às vezes, a fantasiar outras salas mais inteligentes, mais dignas, mais educativas. Devaneios!
Por isso continuo desalinhada, recusando participar nesses jogos de influência, de poderzinhos,de interessezinhos, de intimidades promíscuas, de muito léria e futilidade, …
É que dói mesmo!
O consolo está na descoberta de uns tantos “peixinhos fora de água” e nas esperançosas sementes que plantamos nas salas de aula.
Não é?
Elsa, finalmente deixas a descoberto o teu nome!
ResponderEliminarObrigada pelo teu apoio que, apesar de vindo de uma pessoa que não conheço pessoalmente, está tão próximo do meu sentir.
Desalinhadas, não é?
Pois seja! Pois seja!
Anabela, assino por baixo tudo, tudo o que disse. E mais não digo porque ando em tempos de Alegria (vou partir já daqui a 10 dias para os meus meninos gpequenos e grandes, de Angola)e nem quero pensar numas lesmas pasmadas plasmadas em professores que conheci e conheço. Ah, se eu tivesse podido e se pudesse agora,retirá-los da Escola, onde não pertencem e só prejudicam, que grande rebanho formaria! Mas temos que conviver com a realidade. Sim, temos que conviver mas não temos que pactuar. O seu Grito é necessário e ainda bem que a ele se juntam outros Gritos. O eco vai ser ruidoso. Alguém vai ter que ouvir, mesmo sem querer.
ResponderEliminarObrigada pela ZANGA. Que Ele me perdoe, mas também Jesus se zangou com os vendilhões do Templo. E correu-à cordoada. Que inveja tenho d'Ele! Um abraço da Carmo
Muito obrigada, Carmo. É como eu costumo dizer: "Cego é aquele que não quer ver".
ResponderEliminarGuarde esses momentos de Alegria e goze-os em toda a sua plenitude.
Desejo-lhe um excelente e gratificante trabalho em Angola.
Bjs
Cara Anabela,
ResponderEliminarNão sou professor e vim "parar" aqui através do Blog do Raul Martins. Penso que desde o principio a questão não se colocou honestamente. Ou seja: obviamente o sistema de avaliação encontrado é idiota, demasiado trabalhoso, arbitrário, ... sabe porquê? Porqu foi desenhado para permitir controlar a progressão na carreira. Quando o caminho correcto teria sido admitir um esquema de progressão que não poderia ser "para todos" que teria de ter limites em cada patamar, provavelmente por concurso. Isto não houve coragem para se dizer e para o evitar inventou-se um sistema ainda pior e cheio de erros alguns dos quais menciona no seu post. Obviamente ninguém pode ser juíz em causa própria ... Desculpe a intromissão no seu blog e dar uma opinião que eventualmente não partilha ... Em todo o caso, parabéns com o seu trabalho. Pelo que li é certamente uma excelente professora.
Obrigada, Fernando, por passar por aqui e por deixar o seu testemunho.
ResponderEliminarToda a acção do ministério está inquinada por princípios e objectivos economicistas. E mais não digo.
Quanto à minha actuação como professora ela faz-se muito na base da intuição, do bom senso e das muitas horas que eu dedico, em praticamente todos os dias da minha vida, ao trabalho de formiguinha laboriosa que sou.
Não sei se sou uma professora excelente como coloca no seu comentário. Apenas sei que trabalho para melhorar a cada dia que passa.