A Palavra a Luís Costa
Carta Aberta a Mário Nogueira
Prezado Mário,
Em primeiro lugar, espero que esta carta te vá encontrar de boa
saúde, na companhia dos demais colegas da Fenprof, pois bem precisais dela para
o ano letivo que se avizinha. Nós, por cá (nas escolas) lá vamos desandando, e
todos mal, graças ao último triunvirato ministerial e a alguma falta de arrojo
da vossa parte.
Começo por dizer-te, Mário, que gostei muito de te ouvir, ontem,
na SIC Notícias. Estiveste bem, muito bem mesmo, contrariamente ao outro Mário,
que esteve bem mais crespo contigo do que com o ministro. Coisas! Mas… isso já
não se estranha! Concordei quase em absoluto com tudo o que disseste. Essa é,
aliás, a minha posição mais comum sempre que criticas as decisões ministeriais.
Não há dúvida de que são, por via de regra, pertinentes, rigorosas e acutilantes
as tuas análises. Pena é que, também por via de regra, após esses preliminares
tão prometedores, acabes sempre com uma efabulação precoce, uma espécie de
vitória de Pirro daquelas que só dão mesmo gozo ao próprio. Há qualquer coisa
que não funciona bem quando te sentas a negociar com os ministros. Talvez haja
demasiada ansiedade de ambas as partes.
Estive na concentração do Porto, em frente à DREN. Uma vez mais,
gostei de ouvir e concordei quase em absoluto com o teu diagnóstico preciso. Mas
já não gostei tanto das tuas palavras, no final, após o encontro com o Diretor
Regional, ou seja, da tua terapêutica. Falaste em estar, no início de setembro,
nos centros de emprego, em gesto de solidariedade com os colegas
“descontratados”. Muito bem, mas muito pouco também! Depois, falaste numa “ação
simbólica”, na abertura do ano letivo. Muito mal! Já te digo
porquê.
Nas restantes concentrações de julho, foste variando
sinonimicamente o teu receituário, acabando mesmo por dizer mais ou menos isto:
“estamos a pensar, vamos todos pensar em qualquer coisa no início de setembro”.
Finalmente, seguiu-se o encontro com Nuno Crato e a tua inevitável efabulação
precoce. Mas ele parecia satisfeito e apaziguado! É este o teu calcanhar de
Aquiles, para nossa desgraça!
Mário, tu és um dos mais inteligentes sindicalistas que conheci
na nossa praça. Contudo, a federação que encabeças, embora se demarque muito bem
da FNE, que é uma espécie de pároco do sindicalismo, acaba por fazer um papel
muito semelhante: transmitir aos professores a ideia de que estão a ser
defendidos, dentro do possível, enquanto a máquina ministerial os vai
cilindrando impiedosa e massivamente. Juntamente com os professores, também vai
sendo cilindrado o “serviço nacional de educação” e as esperanças de muitos
portugueses, sobretudo dos mais novos, filhos daqueles que não têm posses para
pagar o conforto das carteiras do privado.
Como tens repetidamente dito, estamos a sofrer o maior ataque
desde que a Escola Pública foi criada. E quando digo estamos, não me refiro
somente a nós, os professores, refiro-me a todos aqueles que podem beneficiar de
uma Escola Pública de qualidade: alunos, pais, comunidades… Então não achas que
grandes males exigem grandes remédios? Então não achas que o pior ataque de que
há memória justifica a maior e a mais contundente reação de sempre? E não achas
que uma ação dessas já devia estar a ser preparada e anunciada, mesmo em tempo
de férias?
Que muitos blogues de professores queiram apenas assumir o papel
de comentadores, de descritores da desgraça, ainda se tolera. Estão no seu
direito, por moto próprio e à sua conta. Mas dos sindicatos exige-me muito mais,
sobretudo em situação de calamidade como a que sofremos. Os sindicatos não estão
no terreno para consolar o nosso espírito e salvar as nossas almas, os
sindicatos existem para defender quem trabalha, para combater incondicionalmente
todas as injustiças que ameaçam ou são perpetradas contra os trabalhadores.
Ações simbólicas e hinos de vitória por migalhas são elementos de uma
coreografia que os desgovernantes conhecem e aceitam muito bem. Useiros e
vezeiros nesse folclore, eles já incluem as cedências vindouras nos cortes
anunciados. E muitas vezes, estranhamente, os sindicatos parecem até
contentar-se com bem menos do que o previsto. Estes cantam vitória e aqueles
compõem um visual tranquila e assertivamente descontente. E o mundo continua a
girar.
Termino esta improvável missiva exortando-te a um encontro com a
História. Faz o que a conjuntura impõe: solicita a adesão das restantes
organizações sindicais, o envolvimento das associações de pais e encarregados de
educação, dos blogues mais representativos da classe, e convoca os professores
deste país para uma greve sem precedentes à abertura do ano letivo. Motivos não
te faltam. Não queiras ser apenas um gestor de infortúnios.
Surripiado ao Luís Costa, tratador do blogue Dardomeu.
Obrigado pela partilha, Anabela!
ResponderEliminarAquele abraço!
Eu é que te agradeço o excelente texto, Luís!
ResponderEliminarBeijinhos!