segunda-feira, 11 de março de 2019

A Palavra ao Professor Luís Braga - Lamento intimista de um cidadão professor português roubado



A Palavra ao Professor Luís Braga 

Lamento intimista de um cidadão professor português roubado


Os episódios desonestos no parlamento, sindicatos e comunicação social à volta e contra a ILC do tempo de serviço docente fizeram-me descrer da Democracia. Dos deputados, do parlamento e dos sindicatos. O impacto pessoal, na minha visão particular, do que se passou é muito profundo. Deixei de acreditar na capacidade de o sistema político e social português se regenerar sem um movimento social que ultrapasse o institucionalismo vigente. Em termos pessoais, essa visão é todo um novo horizonte de vida.
A ILC é um projeto generoso e corajoso de muitas pessoas, que muito me honra que tenham depositado em mim confiança para os representar em vários momentos.
No vídeo do que disse no parlamento creio que se vê essa desilusão pessoal e até emoção pessoal, por trás do esforço de fazer bem o papel que me atribuíram.

Uma visão de vida

Sou oriundo de uma família de professores de que sou a 4ª geração. Ao escolher a profissão, julgava que me daria estabilidade financeira suficiente e o conforto razoável de um trabalho intelectual estimulante. Não queria ser rico. Mas queria viver medianamente e com conforto. E ter uma profissão respeitada. Estou a pensar seriamente mudar de vida, no médio prazo que seja.
E quem me vir a dizer isto ainda vai estranhar: sou professor do quadro, fui diretor, estou colocado na escola da minha colocação definitiva no centro de uma cidade e estou na carreira. Tenho aquilo que tanta gente quer no grupo docente. Há quem tenha mais razões de queixa. Mas tudo é o “homem e sua circunstância”…
Sou o exemplo de alguém que sabe que tem algum talento para outras coisas (e já viveu muito bem dele) e que se fartou do que fazem à educação nacional. A imoralidade tem limites e quem a sofre placidamente partilha da imoralidade dos que a criam. O que vou fazer com estas constatações pessoais ainda medito…

O meu lauto salário e rendimentos….

Ganho 1250 euros líquidos por mês, ao fim de 23 anos de profissão (e não falemos da formação e currículo, para não ter ainda mais a sensação que andei a desperdiçar a vida). É muito mau que, quem forma jovens, acumule a desilusão de que, fazer isso (esforçar-se, estudar e formar-se), é desperdiçá-la.
Mesmo com as batotas que o Governo anda a fazer, estando agora no 3º escalão, já devia receber 1300 euros líquidos mensais desde Setembro. Só em dezembro chegaremos aí.
Com os 9 anos recuperados, ganharia, a partir do momento em que isso acontecer, 1380 euros mensais líquidos.
E os 1380 euros são sem direito a receber nada do que ficou perdido no passado. 1380 euros para futuro. Portanto a discussão dos 9 anos integrais significa para mim um aumento mensal futuro de 180 euros (que não compensa a perda de milhares durante a última década).
E aumentar-me é um problema terrível para os que enchem a boca com a necessidade de “ter os melhores professores no sistema”.
Este, que não será dos piores, daqui a pouco vai-se embora porque ganhará juízo. E não devo ser o único. Há maneiras de ganhar mais. E há muito mundo. Implica risco, mas não há que ter medo do risco.
O outro, pelo menos, não era hipócrita…. Saiam da vossa zona de conforto. E se se sair da área do desconforto?

O caso de roubo dito de forma simples

Devolver 2 anos e uns trocos, de uma perda de 9 anos, não é devolver nada.
É roubar. E quem rouba é ladrão.
E quem é ladrão não pode governar.
Raciocínio simples e direto.
Que pode ser prolongado: quem colabora com ladrões é cúmplice e isso faz dele ladrão.
Quem apoia ladrões, que governam a roubar, é tão ladrão como eles.
Tão ladrão é o que rouba como o que deixa roubar.
E quem rouba aos trabalhadores para pagar aos bancos (mesmo alegando que só empresta) é moralmente um ladrão pior.
Subi em setembro ao 3º escalão (23 anos depois de começar a carreira). Ganho menos do que ganhava há 10 anos. Por isso, objetivamente não subi coisa nenhuma. Recuei.
No meu primeiro emprego em 1992 ganhava mais (ganhava então 180 contos mensais…. o que daria hoje menos de mil euros….mas foi há quase 30 anos…). Em 1993, no ano anterior a entrar na carreira, como vendedor, ganhava o que hoje seriam 1000 euros. Só que escolhi ser professor, com os dados que tinha então….asneira.
Quando o decreto do Governo for promulgado não vou receber seja o que for. Nem em 2019, nem em 2020. Talvez em 2021, só porque tive excelente na avaliação de aulas observadas. E porque completo, então, um escalão de que já devia ter saído, algures na primeira década do século. Se não tivesse o tal excelente, era só em 2022 ( o excelente dá bónus de 1 ano).

Marcelo devia ter juízo e não fazer perguntas imorais e pouco verdadeiras

A pergunta do Presidente Marcelo sobre o queremos é de uma falta de ética atroz: não posso escolher entre nada e zero, porque é sempre zero. Querer ter o apoio eventual do PS em próximas eleições deve obrigar, mesmo assim, a mais pudor.
O decreto dos 2 anos só faz efeito para os que subam de escalão depois de ele entrar em vigor. Embora devesse já estar no 6º escalão, só daqui a 2 anos receberei o montante correspondente ao 4º escalão (2 abaixo daquele em que devia estar, que é o 6º) e, mais de uma década depois do momento em que tinha direito por lei.
Isso significa que, embora digam que vamos subir de escalão e salário, eu vou continuar a receber o mesmo nos próximos 2 anos e, comigo, a maioria do professores que, no último ano foram colocados em escalões inferiores aos que têm direito, com 10 anos de atraso.

O decreto foi desenhado assim: dizemos que sobem de salário, mas realmente não sobem.

Um roubo. E que só parece não o ser, porque nos explicamos mal. Falamos demasiado de tempo e pouco de salário.
Temos vergonha de que, para trabalhar bem, precisemos de ser bem pagos? Os professores não são mercenários, mas não têm de ser missionários. 1380 euros é assim um salário tão alto, para um profissional qualificado e experiente, senior, como agora se diz?
O ministro devia ter vergonha do que disse no fim do Conselho de Ministros. Ser roubado à traição não reforça as comunidades educativas. É tão só ladroagem.

2 anos, uns meses e uns dias contados para o próximo escalão significam zero em salário, hoje. Zero.

E a culpa é do Governo. Mas também daqueles que nos deviam defender com inteligência e zelo e andaram a brincar estes 4 anos e a gerir mal o problema. A pensar nas politiquices partidárias. Tão ladrão é o que rouba como o que deixa roubar.
Alguns deles (a maioria) desses dirigentes sindicais, que dizem representar-me, não me podem representar porque não me entendem (a mim e aos outros como eu). Realmente é fácil ver a realidade de certa forma, sentado no salário do 9º ou 10 escalão (umas centenas de euros acima daquele por que luto) em alguns casos com menos tempo efetivo de aulas dadas do que eu (que estou no 3º, recordo).
Ou não as dando de todo. Realmente nessa circunstância até pode esperar-se serenamente que uma petição tonta (quando há lei em discussão aberta por via do ILC) chegue ao seu final parlamentar só em junho. Nessa altura, passaram 18 meses desde 1 de janeiro de 2018 e eu perdi uns 2000 euros acumulados todos os meses, com as habilidades politico-sindicais e os jogos florais imorais.

Para o dia da manifestação já tenho outros compromissos.

Mas ainda que não tivesse, ninguém me apanhava lá. Estou cansado de ser figurante em jogos mentirosos. Fiz o que podia, a lutar até ao limite das minhas forças, e ninguém com ética me pode acusar de trair a classe a que pertenço.
Eu não traí, mas há quem traia e continue a poder fazê-lo, porque muitos se calam e conformam com o jogo como ele vem sendo jogado. A minha vida está feita e posso fazer sempre o que fiz: faço-a eu.
Milhares de horas de formação depois, avaliado de excelente com aulas observadas, reconhecido pelos alunos. Que mais querem para me pagarem um salário que ache justo? E mais ainda, o que me prometeram, quando em 1995 decidi escolher desperdiçar os meus talentos potenciais para outras coisas a escolher ser professor?
Porque havia uma carreira e certos direitos…..Roubaram-ma.
Querem os melhores na profissão? É isso? E que tal pagarem com o mesmo ângulo com que pagam aos “melhores gestores”.
Os meus alunos têm resultados comigo (por seu mérito, mas também porque, pelo menos, façam-me essa justiça, não os estrago…). Podem dizer-me o mesmo dos que gerem ou geriram os bancos e empresas que tanto reverenciam?
Se eu for multado na estrada que me leva à escola posso meter a multa à escola? Pois não…. Isso era roubar.

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