segunda-feira, 22 de abril de 2019

Encostar às Boxes

Eu por Aí 
Fotografias de Miguel Matias

Encostar às Boxes

São já 57 mil quilómetros de coça variada dada a este veiculo que, volta e meia, geme a bom gemer à conta dos caminhos das pedras sem fim que eu decido percorrer, intercalados com raros mas muito saborosos momentos de espampanantes pausas.
As revisões, feitas amiúde, são para cumprir religiosamente, muda o óleo aqui, substitui uma vela acolá, pneus novos de quando em vez também podem ser precisos, hora de substituir o farolim não sei das quantas e o pára-choques convém não chegar ao ponto de ficar preso por arames, olha os calços dos travões que estão já mais do que nas lonas... e tudo o mais que se possa imaginar num veiculo todo o terreno como o que eu uso todos os dias da minha vida e que é a minha carcaça.
E é assim que, volta e meia, é preciso arrumar a carga nos contentores para encostar às boxes voando pelo espaço fundo.
Rugem baixinho os motores... cantemos...

A carga pronta metida nos contentores
Adeus aos meus amores que me vou
P'ra outro mundo
É uma escolha que se faz
O passado foi lá atrás

A carga pronta metida nos contentores
Adeus aos meus amores que me vou
P'ra outro mundo
Num voo nocturno num cargueiro espacial
Não voa nada mal isto onde vou
P'lo espaço fundo

Mudaram todas as cores
Rugem baixinho os motores
E numa força invencível
Deixo a cidade natal
Não voa nada mal
Não voa nada mal
Não voa nada mal
Não voa nada mal
Não voa nada mal

Pela certeza  dum bocado de treva
De novo Adão e Eva a renascer
No outro mundo
Voltar a zero num planeta distante
Memória de elefante talvez
O outro mundo.

É uma escolha que se faz
O passado foi lá atrás
E nasce de novo o dia
Nesta nave de Noé

Um pouco de fé
Um pouco de fé
Um pouco de fé
Um pouco de fé

Um pouco de fé
Um pouco de fé
Um pouco de fé
Um pouco de fé


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