Home - 10º E - Ano Lectivo de 1992/1993
Alteração de Procedimentos
Iniciei a minha actividade profissional como docente na extinta Educação de Adultos. Leccionei em escolas primárias, à noite, em freguesias do concelho de Amarante e mesmo Marco de Canaveses. Estou a ouvir a minha mãe a perguntar-me com uma ponta de receio na voz "E tu vais aceitar, minha filha?" Tratava-se de aceitar um horário incompleto, numa aldeia do Marco de Canaveses, chamada Paredes de Viadores, que me obrigava a fazer 60 quilómetros todas as noites, e a chegar a casa já depois da meia-noite. Pois aceitei. E durante vários anos continuei a aceitar horários nocturnos, nas freguesias mais diversas, que me possibilitaram acompanhar completamente o crescimento da minha filha ainda muito pequena.
Na Educação de Adultos habituámo-nos a cativar os alunos com aulas muito práticas e agradáveis de que faziam parte actividades extra-curriculares diversas, como a realização de magustos no dia de S. Martinho, em que fomentávamos o convívio entre alunos de escolas vizinhas, festas de Natal, de Carnaval, com concursos de máscaras, grandes festas de final de ano em que por vezes até participava a rádio local. Era uma alegria e uma boa forma de cativarmos os alunos para voltarem a sentar-se de novo nos bancos da escola, que não raras vezes associavam a más recordações de castigos corporais como latadas, palmatoadas, canadas, permanências de pé voltados para um canto da sala, e até ao estarem ajoelhados em cima de grãos de milho, naquilo que constituíam autênticas torturas infligidas pelos nossos professores primários formados no Estado Novo. (Eu como aluna também conheci o género!)
Saí da Educação de Adultos no ano lectivo de 1992/93, ano em que fui colocada na Escola Secundária do Marco de Canaveses. Leccionei História a esta turma do 10º ano que está postada no meu blogue e com quem estabeleci uma relação muito especial. No final do ano lectivo convidei-os para um lanche em minha casa e lá vieram eles até Amarante. Vieram quase todos, ao todo dezasseis e eles não eram muitos mais. Alunos que eu passei à disciplina e que eu chumbei... sim, porque a amizade entre professores e alunos tem que prevalecer para além das avaliações. Recordo de cor vários nomes... Maria João, Francisco, Carla, Paula, Nelson (que teve a gentileza de estar presente no funeral da minha mãe e que, passados todos estes anos, eu não reconheci! Só pelos seus olhos azuis depois de óculos de sol retirados!) ...
Continuei com estes procedimentos. Outras turmas passaram por minha casa, para o costumeiro lanche, ou pelo bar da escola, ou pela arca dos gelados...
Até agora sempre avisei os meus alunos, no início do ano lectivo, que teste sem negativas dá direito a prenda para cada um dos elementos da turma... foi sempre uma forma de os espicaçar para o trabalho e para o esforço porque sem eles nada feito! E quando eles conseguem ficam felizes e orgulhosos de tamanho feito e vêm logo em grande alvoroço cobrar a promessa da sua professora que a cumpre religiosamente. De forma quase simbólica, claro está!
Pois este ano, depois de mais uma vez ter procedido desta forma com o meu 8º F, única turma a ter um teste com zero negativas durante o ano, dei comigo a pensar que tenho que alterar procedimentos.
É que nós vamos entrar em avaliação e vamos ser avaliados pelos alunos e pelos pais dos alunos e eu sou muito cuidadosa. E não quero ser mal interpretada... se é que me faço entender!!!
Gosto de jogar na antecipação.
Ok, lá haverá alteração de procedimentos!
Espero que a alteração de procedimentos não conduza à tentação de dares aos meninos só positivas e de alargares os lanches e os presentes também aos papás.
ResponderEliminarDizendo de outra forma, espero que a "avaliação" não sirva apenas para obter os números que convêm. É que neste mundo global, que se quer de base científica, tudo tem de ser parametrizado e quantificado. Os números falam por si, tornam o mundo incontestável, o que não tem número não conta. Portanto, há que os obter e atirar com eles, bem do alto, à cara dos pategos, que não percebem destas coisas. Mas não se atiram com números feios que é falta de educação. Então não há que saber: usam-se as premissas necessárias para criar a equação que dará os números convenientes. Nada mais científico, não é verdade? Na Educação convêm números de escolaridade e de sucesso escolar elevados. Não há equação resolvente mais simples, aperta-se o numerador dos professores e mima-se o denominador dos papás e dos meninos. Et voilà: brevemente seremos educados porque vamos ter dos melhores números da Europa. E nada de perturbar a equação que ela já é complicada (até tem denominador). Não compliquem com essas balelas de que as pessoas não são só números, que a iniciativa pessoal deve ser estimulada, que os valores morais se devem transmitir e preservar. Por favor não baralhem a engenharia que é perigoso.
Sabes que ainda não tinha pensado nisso? Essa de alargar os presentes aos papás até que poderia ser interessante se eu não fosse quem sou. Assim terei sempre que remar contra a maré, alterando procedimentos, que o tempo de borrasca aproxima-se a passos largos das escolas portuguesas, segura de estar a fazer aquilo que amo e segura de estar a fazer aquilo em que acredito.
ResponderEliminarE tens razão, os números da educação são feios e, digo-te eu, reflectem um país também feio. Feio porque também pobre e desprotegido, sujo e mal alimentado, desregulado e desnorteado, maltratado e violentado, que varre sistematicamente a porcaria para debaixo de um qualquer tapete e assobia para o lado fazendo de conta que tudo está bem. Fomos peritos nisto. Somos peritos nisto.
E vamos melhorar os números da educação... olá se vamos!!!!
E queremo-nos comparar aos países nórdicos, com a flexisegurança, com a baixa ileteracia, mas será assim? O facto de os passarmos a todos, deminuirá o analfabetismo, mas nunca a ileteracia... estamos a trilar caminhos obscuros e que vão ter nefastas consequências. O mesmo denominador é, mas poderemos estar com o mesmo denominador que os países mais a norte, mais desenvolvidos em todas as àreas... Mas pronto, vamos ter números de sucesso, o nosso 1.º vai ufanosamente e com a arrogância costumeira, que este país está no topo da formação e educação, esquecendo, no entanto, que a emigração do nosso país voltou a níveis dos anos oitenta. E que a imigração diminuiu... o outro não diz que isto é um deserto! De facto quando o país se tornar definitivamente um resort dos paises ricos, então o sucesso vai ser enorme, não há ninguém de cá para fazer manifestações, contra o statement... Vejam bem, sempre que há maus resultados num exame nacional, vide o exemplo de Física, a Exma. Ministra vem dizer que é preciso um plano! Então isto não é o contrário, actua-se nos maus resultados, não se trabalha proactivamente, por objectivos traçados inicialmente? Bem, deixa-me calar senão levo um processo, porque nesta lógica salazarenta, temos que andar bem caladinhos, sem levantar ondas... viva a Democracia, mas não esta!
ResponderEliminarOps... olha que vais mesmo trabalhar para a biblioteca!
ResponderEliminarQuanto a mim já lá estou, a lançar termos, atrás de termos, como tu viste na sexta-feira.