A Propósito do "Dicas para Bloggers"
A propósito do dicas para bloggers, editado no ProfAvaliação, aviso desde já que estou em completo desacordo com o Ramiro no que aos adjectivos diz respeito. Porque acho que depende.
Conforme pode ser conferido aqui, o Ramiro defende o corte radical nos objectivos quando se escreve nos blogues. E defende até que as frases ficam mais elegantes e soam melhor sem eles, sem os elementos distractores que são os adjectivos.
Ora não concordo. Às vezes acontece-me estar em completo desacordo com o Ramiro, sendo que este desacordo é sempre respeitador das nossas especificidades e diferenças. Mas não concordo. Que hei-de-eu fazer?
Sem mais demora vou ao ataque de tão apaixonante assunto: o uso, ou não uso, dos adjectivos.
Afirma o Ramiro, defendendo o seu corte:
"Ora repare:
1. Ela era uma rapariga muito bonita para quem todos os olhares gulosos dos rapazes se voltavam.
Limpe agora a frase dos adjectivos:
Era uma rapariga para quem todos os rapazes olhavam.
Qual é a frase melhor? A segunda, claro." - afirma o Ramiro.
A primeira, claro está, respondo eu, que é de longe a mais rica e estimulante da minha imaginação febril que, assim espevitada, imaginou logo a cena conseguindo mesmo vizualizá-la.
Ao ler a frase "Ela era uma rapariga muito bonita para quem todos os olhares gulosos dos rapazes se voltavam" pensei logo numa mulher alta e elegante, soberba de bela, suculenta como o raio que a parta, movimentando-se sensualmente num qualquer espaço público, pavoneando as suas formas generosas em movimentos cadenciados, leves e ondulantes... ondulantes... ai meu deus! O peito cheio e provocante... ai meu deus! E... olha-me a figureta daqueles rapazes.... será que vão ficar com torcicolos? Olha! Olha! Caiu de queixos! Aquele com ar de patego caiu de queixos! Kakakakaka...
Quanto à segunda frase, deixando tudo em aberto com um insípido "Era uma rapariga para quem todos os rapazes olhavam", o que despertou em mim? Olhavam porque era bonita? Ou seria apenas muito gorda? Levaria a saia rota? A blusa branca tinha uma grandessíssima nódoa de vinho tinto? Seria extraordinariamente sardenta despertando a curiosidade dos rapazes? Era tão feia, mas tão feia que, apesar de doer olhar para ela, exercia aquela espécie de fascínio irresistível pelo horrível-belo? Teria perdido um tacão num dos sapatos de 12 centímetros e caminharia agora daquela forma ridícula que caminham todas as mulheres quando perdem tacões de 12 centímetros e insistem em não tirar a porcaria dos sapatos dos pés? Pois não sei! E quero lá eu saber! Não faço mesmo a mais pequena ideia e precisava da orientação de um adjectivo, só um que fosse, para me direccionar a imaginação para a direita ou para a esquerda, para a frente ou para trás. Assim, a seco, é-me impossível decidir. Assim dispersei completamente e esse não é um exercício que me agrade.
Outros poderão ter opiniões contrárias. A ver vamos a opinião de quem passar por aqui.
Aceito o contraditório. Mas por mim continuo com os adjectivos, estimulantes de carago da minha imaginação!
Nota final - Reforço o depende. É evidente que há textos em que os adjectivos não se adequam de todo, mas não é certamente o caso deste, despoletado a partir das frases/exemplos do Ramiro.
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17 comentários:
Há nomes que carecem de ser adjectivados. Como tu própria referes, ajudam-nos a entrar na cena, a visualizar o momento, tranportam-nos a esse mundo instantâneo.
Aliás, como nos definirmos ou definirmos o que sentimos, sem adjectivarmos o nosso ser ou estar?
Uma frase sem adjectivos é sem dúvida uma frase mais pobre, e daí muito simples na sua estrutura.
Aliás, uma das formas para que os nossos alunos redijam melhor, é sem dúvida, ensiná-los a empregarem os adjectivos de acordo com a realidade descrita. Esta operação não é fácil, e urge assimilá-la.
Subscrevo todo o teu texto!
Que seria de um simples poema sem um único recurso ao adjectivo?
Mais pobre, menos apelativo, uma tela com formas indecifráveis.
Anabela
Concordo contigo, porque acho o português uma língua tão rica que devemos aproveitar essa riqueza. Mas depende do oblectivo do blogue. Se o objectivo é apenas dar informações rápidas sobre um assunto (estilo twitter mais alargado), é melhor cortar os adjectivos. Se o objectivo é partilhar ideias e textos sobre o mundo que nos rodeia, venham os adjectivos, claro! E há blogues destes dois tipos e de muitos mais. Ainda bem!
Bjs e boas férias
Pois é, Dudú, a nossa vida seria infinitamente mais pobre sem eles!
Não os uasar de todo, usá-los de forma adequada, ponderada, comedida ou até excessiva depende do efeito pretendido e do fim a que se destina o texto.
Só isso.
Bem... e então no texto poético!!!!
Usar, queria ter escrito usar, no comentário anterior!
Subscrevo as tuas palavras, Teresa.
Beijocas e excelentes férias também para ti.
100 adjectivos perde-se cor ... e a cor por vezes faz a diferença toda ...
Supressão de adjectivos na blogosfera?
Esta é uma discussão interessante. Desculpem o adjectivo.
Para quê e por quê suprimir os adjectivos na blogosfera?
Se o meio é peculiar, a língua é a mesma.
Como leitora assídua do blogue da A.M.M. considero que seria uma perda truncar um texto dos adjectivos.
Tornar o texto mais objectivo?
1. O mito da objectividade é, apenas, isso: um mito.
A dimensão humana, de que o discurso linguístico é uma das suas dimensões, encontra-se repleta de tensões e conflitos (interiores/exteriores). Sensibilidades viscerais. Ora, estas devem ser espelhadas na escrita...sob pena de sair desumanizada.
2. Só os juízos de facto permitem a supressão dos valores. Ora, a necessidade de valorar é co-natural ao ser humano.
Por outro lado, os leitores (como eu, confesso) não são débeis mentais que precisem de “ir directamente ao assunto”: captam as oscilações de humor de quem escreve, pressentem-nas no início de cada frase...criam cumplicidades.
Depurar as frases dos adjectivos é pressupor que o leitor gosta de ler meros relatos factuais.
3. Se eu escrever: “José Sócrates é o P.M. de Portugal”. É, certamente, um juízo de facto verdadeiro. Mas se acrescentar: “José Sócrates é o péssimo P.M. de Portugal”, mudou radicalmente a natureza do juízo: de facto passou a (juízo de) valor. Um adjectivo metamorfoseou a frase. Não ficou melhor, mais intensa e mais adequada à realidade?
Outra coisa: quem assume tomadas de posição ou juízos de valor tem, necessariamente (deveria ser sempre assim), de os fundamentar. Argumentar é um exercício revelador do nível cognitivo do emissor e/ou receptor.
No exemplo dado, seria demasiado fácil demonstrar o quão péssimo é o P.M...nem seria considerado um exercício de elevada inteligência. Lamentável. Ops...mais um adjectivo.
Mas que belo post vim eu aqui encontrar. Gostei!
Deixei no Profavaliação o seguinte comentário (que está em consonância com o comentário da Teresa):
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Na minha opinião isso depende do tipo do blogue.
Se for um blogue informativo, tudo bem, concordo.
Agora se for um blogue de divulgação literária, discordo. Deixo aqui o exemplo de um blog de que gosto muito:
http://agavetadopaulo.blogspot.com/
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Anabela, conheces este blogue? Descobri-o, já há muito tempo, depois de ele ter ido ao programa que a Bárbara Guimarães tinha na SICN. Desde aí passo por lá muitas vezes embora quase nunca comente.
Beijnhos
Gostei do trocadilho, Black!
É que a cor, por vezes, faz mesmo toda a diferença!
Belo o teu texto, Elsa! Ops... mais um adjectivo!
Não conheço, Em@, mas vou conhecer.
Ai, ai... "carecem ser" e não "carecem de ser..." :(
Que seria da prosa...para não falar da poesia...sem a adjectivação?
É caso para dizer que iriam "nuas"...e nesse contexto a beleza (adjectivo)...perderia todo o significado.
Já nos basta o acordo ortográfico..."amputador" de tanta riqueza linguística que nos orgulha...agora tirar os adjectivos!
Só espero que os brasileiros não descubram!
Uff!...seria o fim...da capacidade interpretativa do Camões.
Escrevam-se uns novos ...Lusíadas!
Pois é, Hélio, estamos completamente de acordo!
Seja bem vindo a esta minha casa.
Só acrescento: Biba o adjectivo!
Anabela!
Como estás?
Gostei muito deste teu post!
Muito bem pensado e muito bem escrito, como é costume.
Entendo o que o Ramiro diz. Muitas vezes, quando se fazem posts muito longos, o leitor "perde-se", ou melhor, desmotiva-se e não lê até ao fim ou então nem lhe pega. Tentar fazer textos curtos ou relativamente curtos, pode ser uma forma de estimular o leitor a ler e de a informação ser divulgada.
Mas claro que nem sempre é assim. E penso que não depende só do tipo de blog, talvez também do tipo de escrita do autor.
Entendo também, muito bem o que dizes porque muitas vezes precisamos da adjectivação para nos deliciarmos com a imaginação e também com a leitura!
Beijinhos
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