sexta-feira, 24 de julho de 2009

A Propósito do "Dicas para Bloggers"

A Propósito do "Dicas para Bloggers"

A propósito do dicas para bloggers, editado no ProfAvaliação, aviso desde já que estou em completo desacordo com o Ramiro no que aos adjectivos diz respeito. Porque acho que depende.
Conforme pode ser conferido aqui, o Ramiro defende o corte radical nos objectivos quando se escreve nos blogues. E defende até que as frases ficam mais elegantes e soam melhor sem eles, sem os elementos distractores que são os adjectivos.
Ora não concordo. Às vezes acontece-me estar em completo desacordo com o Ramiro, sendo que este desacordo é sempre respeitador das nossas especificidades e diferenças. Mas não concordo. Que hei-de-eu fazer?
Sem mais demora vou ao ataque de tão apaixonante assunto: o uso, ou não uso, dos adjectivos.
Afirma o Ramiro, defendendo o seu corte:
"Ora repare:
1. Ela era uma rapariga muito bonita para quem todos os olhares gulosos dos rapazes se voltavam.
Limpe agora a frase dos adjectivos:
Era uma rapariga para quem todos os rapazes olhavam.
Qual é a frase melhor? A segunda, claro." - afirma o Ramiro.
A primeira, claro está, respondo eu, que é de longe a mais rica e estimulante da minha imaginação febril que, assim espevitada, imaginou logo a cena conseguindo mesmo vizualizá-la.
Ao ler a frase "Ela era uma rapariga muito bonita para quem todos os olhares gulosos dos rapazes se voltavam" pensei logo numa mulher alta e elegante, soberba de bela, suculenta como o raio que a parta, movimentando-se sensualmente num qualquer espaço público, pavoneando as suas formas generosas em movimentos cadenciados, leves e ondulantes... ondulantes... ai meu deus! O peito cheio e provocante... ai meu deus! E... olha-me a figureta daqueles rapazes.... será que vão ficar com torcicolos? Olha! Olha! Caiu de queixos! Aquele com ar de patego caiu de queixos! Kakakakaka...

Quanto à segunda frase, deixando tudo em aberto com um insípido "Era uma rapariga para quem todos os rapazes olhavam", o que despertou em mim? Olhavam porque era bonita? Ou seria apenas muito gorda? Levaria a saia rota? A blusa branca tinha uma grandessíssima nódoa de vinho tinto? Seria extraordinariamente sardenta despertando a curiosidade dos rapazes? Era tão feia, mas tão feia que, apesar de doer olhar para ela, exercia aquela espécie de fascínio irresistível pelo horrível-belo? Teria perdido um tacão num dos sapatos de 12 centímetros e caminharia agora daquela forma ridícula que caminham todas as mulheres quando perdem tacões de 12 centímetros e insistem em não tirar a porcaria dos sapatos dos pés? Pois não sei! E quero lá eu saber! Não faço mesmo a mais pequena ideia e precisava da orientação de um adjectivo, só um que fosse, para me direccionar a imaginação para a direita ou para a esquerda, para a frente ou para trás. Assim, a seco, é-me impossível decidir. Assim dispersei completamente e esse não é um exercício que me agrade.
Outros poderão ter opiniões contrárias. A ver vamos a opinião de quem passar por aqui.
Aceito o contraditório. Mas por mim continuo com os adjectivos, estimulantes de carago da minha imaginação!
Nota final - Reforço o depende. É evidente que há textos em que os adjectivos não se adequam de todo, mas não é certamente o caso deste, despoletado a partir das frases/exemplos do Ramiro.

17 comentários:

maria eduarda disse...

Há nomes que carecem de ser adjectivados. Como tu própria referes, ajudam-nos a entrar na cena, a visualizar o momento, tranportam-nos a esse mundo instantâneo.
Aliás, como nos definirmos ou definirmos o que sentimos, sem adjectivarmos o nosso ser ou estar?
Uma frase sem adjectivos é sem dúvida uma frase mais pobre, e daí muito simples na sua estrutura.
Aliás, uma das formas para que os nossos alunos redijam melhor, é sem dúvida, ensiná-los a empregarem os adjectivos de acordo com a realidade descrita. Esta operação não é fácil, e urge assimilá-la.
Subscrevo todo o teu texto!
Que seria de um simples poema sem um único recurso ao adjectivo?
Mais pobre, menos apelativo, uma tela com formas indecifráveis.

Teresa Diniz disse...

Anabela
Concordo contigo, porque acho o português uma língua tão rica que devemos aproveitar essa riqueza. Mas depende do oblectivo do blogue. Se o objectivo é apenas dar informações rápidas sobre um assunto (estilo twitter mais alargado), é melhor cortar os adjectivos. Se o objectivo é partilhar ideias e textos sobre o mundo que nos rodeia, venham os adjectivos, claro! E há blogues destes dois tipos e de muitos mais. Ainda bem!
Bjs e boas férias

Anabela Magalhães disse...

Pois é, Dudú, a nossa vida seria infinitamente mais pobre sem eles!
Não os uasar de todo, usá-los de forma adequada, ponderada, comedida ou até excessiva depende do efeito pretendido e do fim a que se destina o texto.
Só isso.

Anabela Magalhães disse...

Bem... e então no texto poético!!!!

Anabela Magalhães disse...

Usar, queria ter escrito usar, no comentário anterior!

Anabela Magalhães disse...

Subscrevo as tuas palavras, Teresa.
Beijocas e excelentes férias também para ti.

Unknown disse...

100 adjectivos perde-se cor ... e a cor por vezes faz a diferença toda ...

Elsa C. disse...

Supressão de adjectivos na blogosfera?

Esta é uma discussão interessante. Desculpem o adjectivo.
Para quê e por quê suprimir os adjectivos na blogosfera?
Se o meio é peculiar, a língua é a mesma.
Como leitora assídua do blogue da A.M.M. considero que seria uma perda truncar um texto dos adjectivos.
Tornar o texto mais objectivo?
1. O mito da objectividade é, apenas, isso: um mito.
A dimensão humana, de que o discurso linguístico é uma das suas dimensões, encontra-se repleta de tensões e conflitos (interiores/exteriores). Sensibilidades viscerais. Ora, estas devem ser espelhadas na escrita...sob pena de sair desumanizada.
2. Só os juízos de facto permitem a supressão dos valores. Ora, a necessidade de valorar é co-natural ao ser humano.
Por outro lado, os leitores (como eu, confesso) não são débeis mentais que precisem de “ir directamente ao assunto”: captam as oscilações de humor de quem escreve, pressentem-nas no início de cada frase...criam cumplicidades.
Depurar as frases dos adjectivos é pressupor que o leitor gosta de ler meros relatos factuais.
3. Se eu escrever: “José Sócrates é o P.M. de Portugal”. É, certamente, um juízo de facto verdadeiro. Mas se acrescentar: “José Sócrates é o péssimo P.M. de Portugal”, mudou radicalmente a natureza do juízo: de facto passou a (juízo de) valor. Um adjectivo metamorfoseou a frase. Não ficou melhor, mais intensa e mais adequada à realidade?
Outra coisa: quem assume tomadas de posição ou juízos de valor tem, necessariamente (deveria ser sempre assim), de os fundamentar. Argumentar é um exercício revelador do nível cognitivo do emissor e/ou receptor.
No exemplo dado, seria demasiado fácil demonstrar o quão péssimo é o P.M...nem seria considerado um exercício de elevada inteligência. Lamentável. Ops...mais um adjectivo.

Em@ disse...

Mas que belo post vim eu aqui encontrar. Gostei!

Deixei no Profavaliação o seguinte comentário (que está em consonância com o comentário da Teresa):
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Na minha opinião isso depende do tipo do blogue.
Se for um blogue informativo, tudo bem, concordo.
Agora se for um blogue de divulgação literária, discordo. Deixo aqui o exemplo de um blog de que gosto muito:
http://agavetadopaulo.blogspot.com/
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Anabela, conheces este blogue? Descobri-o, já há muito tempo, depois de ele ter ido ao programa que a Bárbara Guimarães tinha na SICN. Desde aí passo por lá muitas vezes embora quase nunca comente.

Beijnhos

Anabela Magalhães disse...

Gostei do trocadilho, Black!
É que a cor, por vezes, faz mesmo toda a diferença!

Anabela Magalhães disse...

Belo o teu texto, Elsa! Ops... mais um adjectivo!

Anabela Magalhães disse...

Não conheço, Em@, mas vou conhecer.

maria eduarda disse...

Ai, ai... "carecem ser" e não "carecem de ser..." :(

Hélio Matias disse...

Que seria da prosa...para não falar da poesia...sem a adjectivação?
É caso para dizer que iriam "nuas"...e nesse contexto a beleza (adjectivo)...perderia todo o significado.
Já nos basta o acordo ortográfico..."amputador" de tanta riqueza linguística que nos orgulha...agora tirar os adjectivos!
Só espero que os brasileiros não descubram!
Uff!...seria o fim...da capacidade interpretativa do Camões.
Escrevam-se uns novos ...Lusíadas!

Anabela Magalhães disse...

Pois é, Hélio, estamos completamente de acordo!
Seja bem vindo a esta minha casa.

EMD disse...

Só acrescento: Biba o adjectivo!

Cristina Ribas disse...

Anabela!
Como estás?
Gostei muito deste teu post!
Muito bem pensado e muito bem escrito, como é costume.

Entendo o que o Ramiro diz. Muitas vezes, quando se fazem posts muito longos, o leitor "perde-se", ou melhor, desmotiva-se e não lê até ao fim ou então nem lhe pega. Tentar fazer textos curtos ou relativamente curtos, pode ser uma forma de estimular o leitor a ler e de a informação ser divulgada.

Mas claro que nem sempre é assim. E penso que não depende só do tipo de blog, talvez também do tipo de escrita do autor.

Entendo também, muito bem o que dizes porque muitas vezes precisamos da adjectivação para nos deliciarmos com a imaginação e também com a leitura!

Beijinhos

 
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