Enxaquecas e Urgência do Hospital de Amarante
Confesso que desde que me lembro sempre fui cliente do Serviço de Urgência do Hospital de Amarante. Em miúda, ainda com as freiras a povoarem o Hospital, fui cliente forçada à custa do meu bom comportamento, que até hoje deixou marcas num braço partido, numa cabeça rachada e outras coisas menores. Também fui cliente assídua à custa de ataques súbitos de anginas bravas que exigiam injecções de penicilina, bravas como o raio que as parta, que ainda as sinto entrarem-me corpo adentro. E também não me posso esquecer das minhas famosas alergias nas mãos e nos braços, decorrentes de picadas de insectos e sei lá mais eu o quê e que se prolongaram até aos dias de hoje. Já adulta, casada e mãe de filha relembro aquela vez em que cheguei ao Hospital pelas três da manhã, conduzindo o meu automóvel, com um braço completamente queimado à custa de um ovo estrelado que me explodiu sobre a pele e me fez exclamar "Ah! Olha, engraçado! Não me doeu nada". Pois pudera! As terminações nervosas tinham ido para o maneta e ainda hoje guardo a medalha no meu braço direito. Relembro ainda aquela vez que lá cheguei pelas duas da manhã com uma violenta dor no peito, não sabendo eu se estaria a ter um qualquer ataque, nem eles, e pelo sim pelo não, pastilha debaixo da língua, cardiograma, análises e lá fiquei encostadinha numa maca, a dormir pois então, que não estou habituada a tomar nada e a medicação deu-me uma pedrada de sono que não dava por burro nem por albarda.
Fui também cliente já no papel de mãe, com a minha filhota pequena, um tombo de bicicleta, umas anginas a precisarem de penicilina ainda brava como o raio que a parta, umas alergias esquisitas, que quem sai aos seus não é de Genebra.
Durante muitos anos fui sempre muito bem atendida no Hospital de Amarante, nomeadamente nos Serviço de Urgência. As condições físicas nunca foram famosas mas isso pouco importa quando somos tratados com simpatia e carinho.
Ontem fui de novo ao Serviço de Urgência atrapalhada com uma enxaqueca que se manifestou logo ao acordar. Tomei o medicamento do costume, tentei tomar o pequeno-almoço, naúseas, tremuras e já mal consegui chegar à cama onde me enfiei em silêncio e em completa escuridão.
Sem abrandarem durante todo o dia, as dores de cabeça, violentas, obrigaram-me a entrar hospital adentro, tal e qual como em Setembro passado, pelo mesmíssimo motivo.
Como explicar a sensação de entrar, pelas duas vezes, num hospital mais do que rafeiro do terceiríssimo mundo?
Em Setembro uma miúda ao meu lado, gatinhava pelo chão, metia as mãos à boca, gatinhava sala de urgência adentro... e podia? apoiava-se na porta da entrada... e eu espantada com aquilo tudo... porque me parecia tudo menos um hospital/local decente.
Os bancos de tinta toda descascada e cheios de surro, as paredes todas borradas, médicos carrancudos, movendo-se devagar devagarinho, que literalmente arrastam os pés pelos corredores fora, sem força anímica, e que só se entusiasmam em discussões de futebol entre eles, que ecoavam pelo corredor fora e eu estava lá ao fundo e com uma violenta dor de cabeça...
Deite-se aí - ordenou-me o médico, ontem, apontando-me para uma marquesa com uma "protecção" de papel toda suja e esfarrapada. E eu deitei-me. Estava mesmo mal. Deitei-me sem discutir sobre uma "protecção" por onde já tinham passado quinhentos mil corpos antes do meu. A mesma coisa quando me apontou para uma maca, já no corredor, onde me deitei sobre um lençol sujo e usado. Não refilei porque não conseguia. Mas registei a falta de brio, o desprezo pela pessoa humana doente que deve ser tratada com dignidade, a falta de ética, o laxismo daquele pessoal do Serviço de Urgência que nem sequer está preocupado com a falta de higiene, palha seca para a propagação de doenças.
E lá foi ele embora, sem me dar alta, passada a outro médico e quem a dada altura disse:
- Devem-se ter esquecido de mim.
E foi assim que consegui sair.
Entretanto hoje andei o dia todo com umas comichões esquisitas na cabeça.
Terei apanhado piolhos na Urgência do Hospital de Amarante?
Alguém vai ter que me analisar o cabelo, graças à deus curto, né?
E só me faltaria mais esta!
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