segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Partilha - Aconchego

Auto-Retrato - Budapeste - Hungria
Fotografia de Anabela Matias de Magalhães

Partilha - Aconchego


Recebi a missiva que abaixo transcrevo no passado dia 11 de Novembro. Não é a primeira deste teor, vinda de pais/encarregados de educação, que recebo aqui no recato da minha caixa de correio electrónico e que publico. Para ser sincera, esta é mesmo a segunda que publico, vinda de pessoas desconhecidas, que permaneceriam no anonimato caso não se dessem ao trabalho de teclar e me enviar o conteúdo que entenderam por bem enviar. Confesso que o seu conteúdo, chegado nesta conjuntura particular da minha vida profissional, me aconchegou a alma e o coração nestes dias difíceis que se vão vivendo dentro e fora da Escola. Confesso igualmente que acabo sempre por receber estas mensagens com algum espanto face à delicadeza do gesto, tão pouco habitual entre nós.
Transcrevo a mensagem agarrando-me ferozmente à defesa da partilha, que eu sempre defendi e defenderei - a partilha deve acontecer, a partilha deve defender-se e, ainda mais importante, deve praticar-se.
Acredito que, se outros partilharem comigo, terei mais hipóteses de evoluir enquanto profissional e enquanto ser humano e que se eu partilhar com outros esses outros terão igualmente mais hipóteses de evoluir durante a sua caminhada porque o caminho que se percorre com amparo é um caminho mais suave. A vida é um toma lá dá cá permanente e assim é que está correcto e assim é que ela é equilibrada. Dar, o que se pode dar aos outros, não custa nada e pode fazer toda a diferença. É assim um pouco o espírito de uma dadora de sangue, que eu também sou. Defendo a partilha na teoria... e pratico-a na prática... porque teoria sem prática é igual a simulacro seja do que for e eu abomino simulacros.
Continuarei a partilhar. Agora, bem sei, com um pé atrás relativamente a esta partilha que já foi total.
A ver vamos o que decidirei no futuro.
E agora reparo... a minha resposta saiu-me um pouco amarga... mas há dias assim...

Obrigada, Conceição, pela autorização concedida para publicar a sua mensagem.
Obrigada, Conceição, por me amparar a caminhada.

Boa tarde Profª Anabela

Tenho uma filha no 7º ano e “descobri” o seu blogue. Naturalmente que as aulas dela vão a par das suas e é engraçado ( e útil)“acompanharmos” as vossas…
Numa altura em que o ensino e a classe dos professores estão muitas vezes “debaixo de fogo”, acho que também deve fazer bem ao ego receber um elogio… em especial se for de alguém anónimo e desinteressado. É isso que pretendo fazer com este mail: dar-lhe os parabéns pelo blogue, pelos Power Point que disponibiliza… pelo empenho que me parece ter naquilo que faz. Espero que os seus alunos correspondam ao seu esforço e aproveitem bem.
Eu e a minha Francisca continuaremos a acompanhar o seu trabalho, como complemento das aulas dela ( e para minha satisfação pessoal, pois História sempre foi a minha disciplina preferida…).
Bem haja pelo esforço e dedicação aos seu trabalho e aos seus alunos e por compartilhá-los com tantos outros mais.

Conceição Gancho Martins

Boa tarde Conceição

Nem imagina como me souberam bem as suas palavras recebidas numa conjuntura tão dramaticamente má para os professores e, ainda mais grave, para o país no seu conjunto.
E nem imagina o quão importante é para mim, pessoal e profissionalmente, o tê-las recebido hoje.
Portugal é um país difícil para quem quer, de facto, trabalhar, dar o máximo de si e apenas não fazer mais porque é humanamente impossível. E este é o meu caso. Trabalho porque gosto muito daquilo que faço, a minha sala de aulas é o meu sítio preferido em toda a Escola, os meus alunos a razão da minha existência profissional. Tudo o resto é fait divers incluindo uma indignidade que por aí subsiste chamada Avaliação de Desempenho Docente e que deveria chamar-se Avaliação de Desempenho Doente e que colocou os professores, tantos neste país, que como eu dão o litro pela sua profissão, que trabalham milhares de horas para além do seu horário normal, como alvo de chacota de uns quantos tristes que para nós olham gozando de fininho "Olha, olha, queres ver que esta/este tem a mania que é boa/bom? Queres ver que esta/este tem a mania que é inteligente? Queres ver que esta/este tem a mania que é excelente?"
O ambiente nas escolas degradou-se tanto, mas tanto, nos últimos anos, que, confesso, até a mim me dá vontade de baixar os braços... embora saiba que nunca o farei e saiba que continuarei a lutar com todas as minhas forças, sem aldrabices nem malabarismos, por uma Escola Pública que se quer digna, honesta e asseada. Coisa que nem sempre é, muito por culpa do poder central, muito por culpa do poder e de quem o exerce.
Podia ter guardado as minhas aulas, que assim ficariam entre mim e os meus alunos, mas o problema é que eu sou uma defensora acérrima da partilha e não desisto dela nem quando me acusam de me armar em boa, o que não deixa de me causar espanto, estranheza, tristeza.
O meu trabalho fala por si e não me envergonho dele. Penso até, pecado mortal!, que poderá ser útil a outros alunos que não os meus, a outros encarregados de educação, a outros pais, a outros professores, enfim a simples curiosos. Defendo que o trabalho deve ser partilhado de forma generosa e que se todos partilharmos o pouco ou o muito que produzirmos conseguiremos evoluir enquanto comunidade.
Penso... mas não não sei até quando...
Peço desculpa pelo desabafo. Saiba que a sua missiva me deixou particularmente feliz e orgulhosa e que me enrosquei nas suas palavras generosas que me deram alento para continuar uma caminhada que é, à medida que envelheço, cada vez mais penosa. E os alunos não têm nada a ver com isto pois continuo a vê-los, à maioria, sorridentes e entusiasmados nas minhas aulas.
Agradeço-lhe o trabalho que teve ao entrar em contacto comigo para me dizer o que disse. É que a sua atitude é tão invulgar e rara...

Desejo-vos muitas felicidades e que a sua Francisca faça um excelente trabalho este ano.
Eu fico feliz se puder ajudar.

Cumprimentos

Anabela Magalhães

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