sábado, 2 de julho de 2016

Ecos do Manifesto pela Escola Pública - educare.pt


Ecos do Manifesto pela Escola Pública - educare.pt

É verdade, perante a passividade e apatia generalizadas e mais do que instaladas entre o corpo docente português que se vai passarinhando pelos vários fóruns relacionados com a Educação, estamos todos de língua de fora, é certo!, esta lotada de bloggers vão dando o corpo ao manifesto pela Escola Pública, como sublinha Andreia Lobo na extensa entrevista que nos fez e da qual deu eco aqui. Demos ontem, continuamos a dar hoje e continuaremos a dar amanhã, estou certa!, o corpo ao manifesto por esta Escola autofágica que nos cilindra lentamente. Mesmo que sem grandes ecos entre os nossos pares, conseguimos chegar mais longe, conseguimos elevar a nossa voz através da nossa escrita que nos vincula, a cada um de nós, às ideias que temos sobre esta Escola que, quase paradoxalmente, amamos. E por isso "perdemos" tanto tempo às voltas com ela...
Mesmo quando, como assinalou o Luís Costa no seu Bravio, uma postagem sobre o euromilhões tem mais likes e comentários do que uma postagem onde um grupo de bloggers, que escreve sobre Educação, partilha com a restante comunidade educativa um Manifesto em Defesa da Escola Pública.
É caso para dizer... pois, continuamos a dar tiros nos pés... não é, Lai?

Obrigada pelo extenso trabalho, Andreia Lobo! Como já escreveu o Luís Costa, o título não podia estar melhor escolhido.
E vou transcrevê-lo na íntegra. O trabalho da Andreia Lobo. Sim, eu sei, é tãoooooooooo compriiiiiiiiiiiiiiiidooooooooooooooo! E está agora taaaaaaaaanto calooooooooor...

Dar corpo ao "Manifesto pela Escola Pública"


Os autores de 15 blogues na área da educação assinam um post coletivo com a intenção de “recentrar” o debate em torno de questões que consideram pertinentes em matéria de políticas educativas, à parte a polémica instalada.

Uniram ideias na “blogosfera” em defesa da escola pública. Sentiram esse dever, perante os ataques sucessivos por parte dos defensores da manutenção dos contratos de associação que o Ministério da Educação decidiu acabar, face à existência de vagas no ensino público para os alunos que até agora estudavam nos colégios subsidiados pelo Estado.

José Morgado, que escreve no blogue Atenta Inquietude, Paulo Prudêncio (Correntes), Nuno Domingues (Educar a Educação), António Duarte (Escola Portuguesa), Anabela Magalhães (Anabela Magalhães), Ricardo Montes (Professores Lusos), Luís Costa (Bravio), Duílio Coelho (Primeiro Ciclo) e o autor anónimo do Assistente Técnico, aceitaram o desafio do EDUCARE.PT para darem mais corpo ao manifesto que subscreveram.

Pedem autonomia “real” para as escolas, querem menos intromissão do poder político e que o Ministério da Educação acabe com a desconfiança, dizem, instalada ao longo de vários anos na “5 de Outubro” em relação aos professores. Pelo meio ficam à espera de reformas, que consideram essenciais: na revisão curricular realizada pelo anterior ministro Nuno Crato e nas “excessivas” metas de aprendizagem, na carreira docente e no modelo de gestão escolar.

Universalidade de respostas
Conta 40 anos de intervenção direta em necessidades educativas especiais (NEE), sempre ligado aos pais, professores e alunos. José Morgado, psicólogo, defende a escola pública pelo seu “papel insubstituível” quando se trata de “garantir a universalidade de respostas”.  Razão pela qual, diz, espera mudanças nesta área: “O quadro legislativo em NEE carece de urgente revisão porque em nome da inclusão, que é retórica sempre presente nos preâmbulos da legislação, fazem-se enormidades de exclusão.” 

O autor do blogue Atenta Inquietude, afirma que “é importante um aprofundar de uma política real e efetiva de resposta à diversidade”. Sobretudo, “porque nos últimos anos se fez um caminho inverso de normalização, com sucessivos filtros através dos exames e metas curriculares extensas que tornam difícil para os professores acomodar formas de aprendizagem diferentes”.

Em benefício da escola pública, José Morgado defende a criação de dispositivos de regulação - “não de avaliação” – do que se faz nas escolas. Só assim se contrariará o atual “sistema desregulado”, onde “ao abrigo da mesma legislação coexistem práticas de excelência com a maior das mediocridades. Sem discriminação positiva a quem faz muito bem, nem a avaliação reguladora para corrigir o mal que se faz”.  
Algo notório na área das NEE, diz José Morgado: “Há alunos que estão nas unidades de ensino estruturado [de apoio à inclusão] nas escolas que não vão ao mesmo tempo que os outros ao intervalo, não saem das salas e vão pouquíssimo tempo à sala de ensino regular.”

Coragem informada
Assistiu à polémica, dos últimos meses, em torno dos colégios com contratos de associação com o particular interesse de quem reside no concelho das Caldas da Rainha, um dos mais afetados pelo não financiamento de novas turmas. “Admiro a coragem informada do atual Governo em relação às cooperativas com contratos redundantes”, diz Paulo Prudêncio, autor do blogue Correntes, “mas há todo um universo de questões que não podem ser eternamente adiadas”, acrescenta.

Questões que se prendem com o “afunilamento curricular”, fruto da política seguida pelo anterior ministro da Educação, Nuno Crato. Com o excesso de alunos por turma. Os mega-agrupamentos. Questões mais antigas, como o congelamento dos salários e da carreira dos professores ou a avaliação docente, “que não deixa de dar uns murros na dignidade das pessoas porque tem pontuação e tem quotas”, lembra o blogger. “Horários que continuam a ser [estipulados] ao minuto”, onde “têm mais turmas os docentes com mais idade ficando, assim, sem as reduções previstas na lei”. 
Questões que, em geral, reúnem o desacordo da comunidade educativa, mas continuam por resolver, constata Paulo Prudêncio, reconhecendo que “as coisas não podem ser feitas de um dia para o outro, mas é preciso começar porque vem aí um novo ano letivo e está tudo na mesma”. 

A defesa da escola pública impõe uma nova organização do sistema educativo. Mas também o fim do atual modelo de gestão escolar, a funcionar desde 2009. E que, segundo o professor de Educação Física, foi responsável pela entrada nas escolas “do pior da política partidária através dos conselhos gerais”, órgãos que aprovam as regras de funcionamento interno das escolas e onde têm assento representantes dos pais, alunos, docentes, não docentes, comunidade local e dos municípios.  

Mudar orientações ideológicas
Para Nuno Domingues, autor do blogue Educar a Educação, um dos maiores problemas do sistema de ensino, herdado do anterior Governo, foi a revisão curricular de Nuno Crato. “Devia ser profundamente alterada, as artes são absolutamente discriminadas e há uma orientação ideológica que deveria ser repensada.”
A lista de matérias a repensar inclui tanto questões de organização da rede escolar, como os mega-agrupamentos, como de carácter profissional, como a precariedade da função docente, “que antigamente era quase exclusiva dos contratados e agora é transversal a todos os docentes”, constata Nuno Domingues, lembrando que “há docentes do quadro a fazerem aquilo que os contratados faziam há alguns anos –  em termos de mobilidade –, que é estar atentos semanalmente a colocações para ver se vão para uma escola”. 

Fruto dos sucessivos congelamentos na carreira, “há uma falta de motivação” na classe, reconhece o docente. Por isso, a defesa da escola pública não é um tema fácil. Mas uma responsabilidade assumida por quem se dedicou entre 2013 e 2014 a escrever no seu blogue sobre assuntos polémicos, como a denúncia de casos de fraude nas colocações de professores. 

Restabelecer a confiança 
“A prioridade do Ministério da Educação (ME) deveria ser ganhar a confiança dos professores. Abandonando de vez o princípio da desconfiança metódica. E a ideia de tentar fazer reformas contra os professores.” Quem o diz é António Duarte, autor do blogue Escola Portuguesa.
Depois, “há muita coisa que precisa de ser feita”, diz o blogger. Como, por exemplo, rever o modelo de autonomia, “que serve apenas para o ME remeter às escolas os problemas que não é capaz de resolver, continuando a manter um controlo férreo sobre os orçamentos, a abertura de turmas, a contratação de professores e, em geral, tudo o que envolva gasto de dinheiro”.

O excesso de burocracia é um “problema real” da escola pública. “Perde-se demasiado tempo nas escolas, a trabalhar para os papéis, tempo esse que devia ser dedicado aos alunos que mais necessitam da nossa atenção.”
 
Um modelo de gestão de maior proximidade, com equipas mais pequenas e coesas e valorizando a componente pedagógica, seria outra das mudanças bem-vindas. Ao invés de um “diretor burocrata”, ironiza António Duarte, “sentado no seu gabinete a tomar conta dos telefonemas, dos emails e das plataformas informáticas - com que o Ministério controla a par e passo todas as escolas - e a dirigir à distância as restantes escolas do seu agrupamento”. 
A organização curricular herdada do anterior Governo merece críticas já bem conhecidas. O mesmo com as metas de aprendizagem: “Estão desajustadas e são, em muitos casos, inexequíveis gerando frustração nos professores e insucesso nos alunos”, frisa o blogger. 
Grave é o caso dos programas de Matemática, definidos pelo anterior ministro, Nuno Crato, que os professores da disciplina sempre contestaram e estão, assegura António Duarte, a levar muitos alunos a porem de lado a disciplina. 
Racionamento além do razoável
Anabela Magalhães lembra que, nos últimos anos, “o financiamento da escola pública foi estupidamente cortado”. As consequências negativas desses cortes, diz, perduram ainda hoje. Traduzem-se numa redução de efetivos, seja de professores no ativo, de pessoal técnico especializado (no ensino especial e na área da psicologia) e de assistentes operacionais. Mas alastram-se às pequenas peças que diariamente fazem funcionar a engrenagem das escolas.

“Basta pensarmos no racionamento, para além do razoável, de coisas tão elementares e básicas quanto fotocópias, papel higiénico, aquecimento, energia... ou no racionamento de visitas de estudo, ou de idas ao teatro, ou de oficinas, ou ainda de experiências que se deixam de fazer por falta de verbas e que, em alguns casos, seriam as únicas oportunidades, perdidas, de contacto com outras áreas, artes e realidades...”, enumera a autora do blogue com o seu nome.   
A blogger apela ainda a uma visão integrada dos currículos, para evitar repetições de temas entre disciplinas. Como exemplo, a professora refere que há matérias abordadas em História no 3.º ciclo que são igualmente abordadas em Geografia no mesmo ciclo de aprendizagem. “Currículos muito extensos são indutores de stress para alunos e professores e impeditivos, em muitos casos, de uso de técnicas, em contexto de sala de aula, mais condizentes com os tempos que vivemos”, denuncia. 

Laboratório de experiências educativas
Ricardo Montes, autor do blogue Professores Lusos, está cansado de ver os políticos fazerem da escola pública “um laboratório de experiências educativas, maioritariamente mal sucedidas, assim como um campo de batalha para disputas partidárias”. 

A escola pública, sublinha, “está saturada de metamorfoses” uma vez que “por cada Governo eleito temos pelo menos uma revolução na educação”. Por isso, antes de mais mudanças aconselha a que se coloque em cima da mesa tudo o que atualmente existe ao nível dos diversos campos que influenciam a nossa escola, caso da gestão escolar, dos currículos e da organização dos anos letivos. E só depois se conclua sobre se resulta melhor o que realmente não funciona. 
“Por mais que queiramos isolar questões, a escola pública é uma máquina tão pesada, que quando modificamos uma peça alteramos toda a restante dinâmica”, argumenta. 

Escola low cost veio para ficar

Luís Costa, autor do blogue Bravio, apela para “uma efetiva descentralização de competências para as escolas, conferindo-lhes mais autonomia, em vez da aventada municipalização”. Entre as medidas mais urgentes, destaca ainda a dignificação da função docente, que, entende, “depende mais da reposição da confiança e do tempo sonegados aos professores do que de questões salariais, embora estas também sejam importantes”. 

Expectativas em relação à concretização dessas mudanças, seja no atual Governo ou noutro qualquer, tem “poucas”. “Reconheço que muito pela ação dos partidos que o apoiam o Governo tem denotado vontade de mudança. Foram dados passos importantes nestes últimos sete meses. Contudo, temo que, no essencial, o paradigma que une PSD e PS acabe por se instalar.” Um paradigma que, segundo o blogger, assenta na municipalização das escolas, no esvaziamento da autonomia pedagógica dos professores e no fim das retenções. “É a escola pública low cost que veio para ficar, porque o país está na penúria.” 
Um olhar da secretária
O autor do blogue Assistente Técnico tem um olhar diferente dos colegas bloggers e professores que lidam diretamente com os alunos. “Encontro-me numa posição administrativa, numa secretaria”, confidencia ao EDUCARE.PT, mantendo o anonimato que caracteriza a sua escrita na blogosfera. Por isso, o seu testemunho, justifica, incide sobre “o serviço público prestado ao aluno diretamente ou indiretamente”. 

Como trabalhador e pai, confessa que não fica indiferente ao que assiste nos bastidores. Defender a escola pública passaria primeiro por “evitar perder 90% do tempo de trabalho, com problemas relacionados com tudo, menos com os alunos”. 

Por outro lado, “é urgente a criação ou disponibilização de guias de procedimentos” que evitem, por exemplo, que uma escola possa cobrar a um aluno um euro por uma certidão, enquanto outra cobra cinco. Ou que um cartão magnético seja vendido a 10 euros, quando o seu custo à entidade sem fins lucrativos é de três euros.
Uma situação que acontece, “mas não devia acontecer”, pois “provoca a confusão total”, alerta o autor do blogue Assistente Técnico, é a publicação de legislação ou notas informativas com conteúdos que não coincidem em determinados temas por parte das entidades externas às escolas, nomeadamente direções regionais, direções centrais e institutos públicos. 
O Assistente Técnico deposita pouca esperança em mudanças: “Não vamos conseguir atenuar imensas divergências enquanto os Governos se gerirem por Excel”, conclui.

1.º ciclo, o mais flagelado 
Duílio Coelho, o único professor primário do grupo, e autor do blogue Primeiro Ciclo, faz suas as palavras de José Manuel Alho, quando diz que “o 1.º ciclo do ensino básico persiste como o nível de ensino mais flagelado com toda a sorte de experiências tragicamente camufladas de inovações”.

Um professor ou vários? Parece ser a eterna questão que permanece por resolver no 1.º ciclo do sistema educativo. “Passou-se de uma situação de progressiva saída da monodocência, para uma reentrada na monodocência (exceção ao Inglês no 3.º e 4.º anos), com o correspondente apoio à interdisciplinaridade”, exemplifica o blogger, referindo, por outro lado, que “alguns professores no 1.º ciclo com habilitação para lecionar Inglês são impedidos de o fazer na sua turma”.
Acréscimo de horas letivas, 400 minutos por semana a mais do que nos restantes ciclos, e “o silêncio geral, perante a passagem de uma compensação justa das horas letivas em excesso, para dois anos de pausa letiva facultativos, a meio da carreira docente”, metas de aprendizagem desfasadas em relação à faixa etária, são alguns dos motivos pelos quais importa sair em defesa da escola pública. E contrair as marés. Para resolver um outro dilema “da democracia”, como intitula Duílio Coelho: “A falta de debate de ideias, com a maioria dos professores a não ousar contrariar as decisões.”

Sem comentários:

 
Creative Commons License This Creative Commons Works 2.5 Portugal License.