domingo, 28 de maio de 2023

Carta Aberta à Directora do Agrupamento Teixeira de Pascoaes


Carta Aberta à Directora do Agrupamento Teixeira de Pascoaes

Eu não sou, para o bem e para o mal, uma Professora anónima, muito menos uma Professora qualquer. Aliás, nascida e criada, e ainda a viver, no Centro Histórico de Amarante, de onde sairei na horizontal, também não sou, para o bem e para o mal, uma Amarantina anónima, muito menos uma Amarantina qualquer.

Levo muito a sério a Minha Profissão, profissão que livremente escolhi contra ventos e marés e tenho uma reputação que é a minha, construída ao longo de décadas e décadas de trabalho árduo, o mais das vezes solitário... porque a minha pedalada é, de facto, avassaladora e bem difícil de acompanhar. 

Com o tempo, e a imensa capacidade e prática de trabalho até às 3/4 horas da manhã, com aulas às 8:30, melhorei tanto, mas tanto!, as minhas skills que sou capaz, na boa, de estar a fazer várias coisas ao mesmo tempo sem me atrapalhar e fazendo tudo o que entendo dever fazer.

Assim, recordo que depois de sair da Escola Secundária do Marco de Canaveses, onde tive um imenso prazer e gosto em trabalhar, tive a honra de escutar o meu ex-director afirmar-me que se há professores que entram e saem de uma escola sem deixar rasto ou saudade tal não tinha sido o meu caso pois eu tinha deixado um imenso e sentido vazio naquela Escola que um dia foi Minha.

Recordo que depois de deixar a Escola onde hoje lecciono, com outro director evidentemente, rumo à ESA, e após três anos consecutivos de trabalho nesse mesmo estabelecimento, esse director, na primeira véspera do dia de Natal seguinte, surpreendeu-me aqui mesmo nesta minha casa, com um livro escolhido a dedo sobre a cultura árabe, que ele sabia ser especialmente do meu agrado, com uma delicada dedicatória em que me agradecia todo o trabalho que eu desenvolvi na Escola Pública onde ele exercia o cargo de Director. E recordo que, nos anos seguintes, continuou a fazer o mesmo.

Quando saí da Escola Secundária e regressei à Minha Home - exactamente a Escola dirigida há décadas por vossa excelência, e onde ainda hoje continuo a trabalhar, e onde permanecerei o tempo que me der na cabeça, até se pode dar o caso de permanecer até aos 70 só para meter nojo... ou não... - o director da ESA, com quem eu tive uma contenda armada por ele e que teve o feliz desfecho, para mim, no Acordão do Tribunal Central Administrativo Sul, afirmou-lhe que, com a minha saída, a Escola da qual ele era director ficava a perder e que a Escola para onde eu ia ficava a ganhar. 

E foi nestas circunstâncias que voltei para a agora Escola Teixeira de Pascoaes, onde fui quem sempre fui como Pessoa e como Professora: confiável, verdadeira, respeitadora, assumida, interventiva, criativa, resiliente, trabalhadora incansável muito para além das horas que me eram legalmente exigidas... aliás  escutei variadíssimas vezes, ao longo da minha "carreira" profissional, a minha filha a sugerir-me que levasse o colchão para a escola. (Desculpa, Filha!)

A minha relação com os Meus Alunos permanece à prova de bala e, frequentemente, permanece para a Vida. Eles sentem quem entra na sala de aula e deixa lá a pele e o resto.

A pele e o resto deixei eu a fazer isto, isto, isto, isto, isto, isto, isto., isto... e o mais que deixo por linkar para não maçar vossa excelência. Mas não deixo de lhe relembrar especificamente o Projecto História em Movimento, que acabei a implementar sozinha na Escola com a força de um furacão - grata a todos os Meus Alunos que nele acreditaram - e que desapareceu completamente do meu horário, sem qualquer explicação da vossa parte, na segunda alteração feita ao meu horário de trabalho durante este ano lectivo, e o Projecto Ver para Querer, numa parceria feliz com a Ordem dos Nutricionistas e que envolveu múltiplas entidades, e que vossa excelência ora apoiava, ora boicotava, ora não ligava, mas não se coibindo de aparecer em entrevista à TV quando a oportunidade surgiu. Relativamente a este projecto não posso deixar de agradecer o apoio incondicional da professora Elisabete Silva, sempre presente, sempre a apoiar e que vivenciou comigo algumas cenas deprimentes que volta e meia foram acontecendo ao longo dos anos em que este projecto se manteve activo.

E eis que chegamos a este atípico ano em que pode ter a certeza que continuarei a batalhar como uma leoa por uma Escola Pública de Qualidade, que a transcende a si enquanto directora de um Agrupamento da Cidade que é Minha e que me transcende a mim enquanto Professora deste mesmo Agrupamento.

Aproveito para lhe relembrar que a primeira vez que me deu ordem verbal de saída do espaço escolar, mandou-me mesmo para fora do portão da escola, já que eu estava em greve, eu informei-a que não iria sair e dirigi-me aos serviços administrativos onde, por escrito, a questionei sobre a fundamentação legal sobre tão estapafúrdia ordem. Até hoje não recebi qualquer resposta e, como vossa excelência sabe, um funcionário público, que é coisa que a senhora é, ocupando cargos de chefia, tem, por lei, leis a cumprir, nomeadamente quanto a prazos de resposta. Mas escolheu ignorar-me, portanto, e, ao fazer isso, escolheu ignorar as leis deste país.

Hoje encontro-me num outro patamar de indignidade, para vossa excelência... mas que não para mim.

Na quarta-feira passada, dia 24 de Maio, foi-me dada nova ordem de saída por parte de vossa excelência, aos berros e publicamente, da sala do secretariado das provas de aferição, já que, supostamente, eu estaria a fazer greve. Aproveito para lhe relembrar que um trabalhador só entra em greve a partir do momento em que entra em greve, ok? E também que nenhum dirigente superior tem o direito de se virar para os trabalhadores e questioná-los sobre se estão, ou não, a fazer greve já que isso pode configurar pressão ilegal sobre pessoas que estão a exercer um direito que é seu e que se encontra consagrado na Constituição Portuguesa. 

Como eu a informei, calmamente, que não iria sair do local em que me encontrava, vossa excelência, de cabeça perdida?!, desatou numa gritaria a afirmar que quem dava as ordens era vossa excelência, que vossa excelência é que era a directora - lembrei-me do Herman nos seus velhos tempos do "Eu é que sou o presidente da junta!!! - e ameaçou-me, alto e bom som, com um processo disciplinar. Nem me mexi e continuei a informá-la de que não iria sair da sala em que me encontrava. 

Decidiu ir para outra sala, para "não se chatear mais", no dizer de vossa excelência, e deu ordem a todos os outros professores para a seguirem, o que estes fizeram, e acabaram a reunir no corredor imediatamente a seguir à sala onde permaneci sozinha. Nada que me espante, apesar da indignidade da situação, apesar do ridículo da situação, a fazer-me equacionar se o meu local de trabalho é local de brincadeiras parvas e infantis, promovidas pela senhora diretora, enfim, de coisas sem jeito nem ponta por onde se lhe pegue.

Não escutei o que transmitiu aos meus colegas de viva voz mas, pelos vistos, excluiu-me, deliberadamente, de informação que eu também deveria ter recebido já que foi aí que os restantes professores foram informados que a prova de aferição não se realizaria devido à greve de dois professores coadjuvantes. Relembro-a - um trabalhador entra em greve quando entra em greve e eu, que cumpri a mais longa greve que realizei em toda a minha vida, desde o dia 9 de Dezembro até dia 12 de Maio, e que foi variando na forma, não entrei em greve no passado dia 24 de Maio "apenas" porque não me apeteceu.

Para finalizar, esteja à vontade para dar cabo do meu horário as vezes que lhe apetecer. Esburaque-o as vezes que lhe apetecer e o quanto lhe apetecer e tenha a certeza que aproveitarei todas as minhas horas livres da forma que me apetecer, da forma mais oportuna, mais relevante e mais importante para mim. 

Por exemplo, o furinho que me criou todas as terças-feiras ao terceiro tempo da manhã, a coberto de um chapéu gigantesco chamado interesse do serviço ou coisa que o valha, no dia 23 de Março foi por mim aproveitado para ir à GNR informar os senhores agentes que, se vossa excelência caísse na tentação, como outros directores, de mandar um professor substituir um outro professor em greve numa qualquer sala de aula eu iria, de imediato, chamar a GNR para que esta abrisse um auto de ocorrência, identificasse as testemunhas o o mais que fosse necessário pois, relembro-lhe, este país rege-se por Leis que não podem ser torcidas segundo as nossas conveniências.

Relembro-lhe ainda que, tal como eu afirmei alto e bom som à época, os serviços mínimos decretados pelo vergonhoso Colégio Arbitral foram ilegais e que agora isso está a ser afirmado pelo Tribunal da Relação e por senhores juízes.

Já agora aproveito também para lhe relembrar que durante cerca de duas semanas só eu, em todo o agrupamento, fui requisitada para serviços mínimos. 

Como assim? Sou assim tão especial?

E por agora termino, que esta carta aberta já vai muito longa. Da minha parte, asseguro-lhe que a minha postura enquanto docente continuará a ser exactamente a mesma. Conte com muito trabalho da minha parte, muita frontalidade e muita honestidade naquilo que faço. E que faço bem. 

E relembro-a que tenho 61 anos e que adoro brincar... mas é com os meus netos.

Atenciosamente, e com os meus melhores cumprimentos,

Professora Anabela Magalhães

32 comentários:

Anónimo disse...

A Professora Anabela é das que veste a camisola pela sua profissão, que defende os seus direitos mas que nunca abandona os seus alunos ao longo da vida. O que a senhora diretora tem vindo a perpetuar nela e em todos os seus professores é uma luta partidária e não de classe. Lembre-se Dina, os cargos são provisórios, a honra e dignidade NÃO. Lembre-se que antes de ser diretora era educadora. Aliás, tem outro bom exemplo dentro de casa de um professor que sempre afastou os livros e programas para ensinar a música aos alunos da melhor forma que eles a compreendiam, nem que fosse a brincar. Fico triste por ver a nossa, sua escola neste estado, uma escola com HISTÓRIA.

Anónimo disse...

Era fazer um debate, mas infelizmente em Amarante não há comunicação social. A rádio local é xuxalista, só vai fazendo outros trabalhos para justificar os subsídios atribuídos pelo município. Força, és a voz de tantos professores oprimidos, cansados.

Anónimo disse...

Anabela, não nos conhecemos físicamente, mas o seu relato, a sua firmeza de convicções fazem de si um exemplo de integridade!
Obrigada por lutar por tantos outros cuja a terrível covardia fica desmascarada. Eu também fiz greve aos serviços mínimos, as provas de aferição e que venham outras... lutaremos!!!!

Anónimo disse...

Como gosto de ti Anabela!
És mesmo assim, especial.
❤️

vilarinho disse...

Parabéns colega, pela sua coragem e frontalidade. Dos fracos não reza a história.

Anónimo disse...

Parece que nesse agrupamento todos têm medo menks a professora AnaBela.
Triste agrupamento e tristes colegas.

Anónimo disse...

Professora Anabela, sendo eu amarantina e não querendo estar a falar de casos em particular apenas tenho a dizer que enquanto ex aluna dessa escola e da outra que também mencionou, de facto nota-se que há cargos cujas pessoas ocupam por demasiado tempo e por ventura chegam a sentir-se donos desses locais. Há uma linha que separa se CHEFE de ser LIDER e como tal há pessoas que a palavra LIDERANÇA não lhes serve. Pena é que para alguns " o medo de ser livre provoca o orgulho de ser escravo". Muitos parabéns pela cidadã que é sobretudo conhecedora dos direitos e deveres. Certos cidadãos acham que os "seus" subalternos (este sentido de propriedade sobre os outros é vergonhosa, mas existe)só devem cumprir os deveres que lhes são impostos.... um verdadeiro RX deste país.

Anónimo disse...

Caríssima colega Anabela,
Apesar de não nos conhecermos pessoalmente, admiro a sua combatividade e firmeza em prol de causas justas e honestas. Aqueles que tentam derrubá-la, devem esquecer-se que ainda lhe dão mais força na defesa de uma escola pública de qualidade, maior apoio entre pares e pelo cidadãos honestos e justos deste país. Receba a minha admiração e solidariedade. Beijinhos 😘

João disse...

Um destes dias, vou me reformar, mas fico feliz por saber que ainda fica gente , que lutará contra " ventos e marés"por um ideal de escola pública...

Anónimo disse...

Grande mulher , grande professora .

Anónimo disse...

Cara Anabela, Parabéns! Os diretores têm a mania que mandam....mas, são professores, que exercem o cargo de diretores.
Faça queixa de assédio! A única nos serviços mínimos?
Estes ditos coleguinhas fazem a vida negra aos não amiguinhos...aguardo o dia em que sejam eleitos pelos pares!
Forte abraço.

Anónimo disse...

Parabéns, professora Anabela pela grande lição de cidadania que está a dar aos nossos filhos. Só lamento não haver nesse agrupamento mais professores como a senhora. Quanto à sra diretora, é mais uma incompetente à frente de uma escola pública. Quando não tem argumentos impõe-se pelo autoritarismo, uma ditadora muito fraca. Faz falta a professora Elisabete nessa direção! Força, professora, continue com essa coragem e determinação!

Anónimo disse...

É o que dá dar o poder a uma educadorazeca cheia de prepotência! Pena não haver mais professores como a senhora! Essa escola precisava!

Anónimo disse...

Colega, qwue vergonha de diretora está à frente do agrupamento... Um cão amestrado do ministro???? Esquece se que é tb docente...
Parabéns pela sua coragem e força
Para
ParaPbens é n

Anónimo disse...

👋👋👋Olá Anabela. Sou professor de História aposentado, mas recordo os seus diaporamas e a forma como partilhava com todos o seu imenso trabalho. Força, é um orgulho ter nesta profissão PROFESSORES como a Anabela e não serão diretores que em muitos casos fugiram das salas de aula que farãovesquecer o seu empenho, trabalho, profissionalismo e coragem

Anónimo disse...

Muitos parabéns, Anabela! Tenho acompanhado a tua luta e o que te têm feito. Sou de Lisboa e, infelizmente, os Diretores quando se encontram no lugar, já não o querem largar e são tudo menos líderes. A maioria nem gostava de ensinar, só queriam poder
Obrigada

Anónimo disse...

Força 🌷

Anónimo disse...

Caríssima professora👏
Gostei muito de ler,esta carta fez me lembrar um acontecimento que tive com essa pessoa.
Quando me fala em gritaria,lembro me logo das galinhas do capoeiro,pois são criaturas sem postura nenhuma!!!
A nossa escola esta pobre,muito pobre a começar, na dita excelência e acabar naquelas criaturas que a seguem...
Falta ética e assima de tudo respeito pelas pessoas....
Não desista!! Bjs aluna da ESA.

Anónimo disse...

Grande Anabela! És um exemplo para muitos! Força!

Anónimo disse...

Muita força
António Silveira

Anónimo disse...

Única coisa que posso fazer é tirar o chapéu. Muito bem Professora Anabela

Unknown disse...

Coragem colega, é um orgulho. Tivéssemos todos essa coragem para enfrentar algumas bestas que se agarram aos lugares de Diretores décadas a fio e acham que estão acima da lei. Um bem haja.

Anónimo disse...

És uma lufada de ar fresco perante este (Des)Governo. Só poderias ser de História e só não sente, quem não é filho de boa gente. Foi um prazer conhecer-te enquanto pessoa e enquanto colega que luta por uma Escola Pública de qualidade. Tal como tu, também eu sou professora de História e, aparentemente, assusto as lideranças com o meu profissionalismo, os bons resultados escolares e projetos desenvolvidos. Não vou parar! ❤️

Anónimo disse...

Chefes pobres de espírito nunca deveriam liderar outras pessoas. Infelizmente coisas desse género acontecem em quase todas as Escolas. A nossa dignidade e sentido de dever cumprido falam mais alto do que a humilhação que os diretores fazem aos professores que estão fora do seu círculo de ‘amigos’.

Mjpp disse...

Grande exemplo de cidadania e de ética profissional dá a Professora Anabela. Obrigada pela luta que tanto me motiva a nunca desistir dos ideais de um país mais justo e menos corrupto. Devíamos ter muitas professoras assim e muitos cidadãos sem medo e com ganas de mudar o futuro! Os valentes foram e serão sempre os heróis. Dos cobardes não reza a história.

Francisco Cantanhede disse...

Francisco Cantanhede
Quem viveu 21 anos numa ditadura, quem esteve no Largo do Carmo no dia 25 de Abril de 1974, quem aprendeu a amar a LIBERDADE à custa do sofrimento que a falta da mesma provoca, só pode afirmar: obrigado Anabela, uma verdadeira MULHER de ABRIL, uma Mulher que não se cala, uma Mulher que não se deixa subjugar!!! Antes morrer na rua a gritar viva a LIBERDADE do que voltar a viver numa ditadura!!!

Anónimo disse...

Eis um dos enésimos exemplos daquilo que é e sempre será o inenarrável despautério dos diretores das escolas "grosso modo".
A culpa não é deles é do sistema político que lhes atribuiu uma autonomia que, definitivamente, não sabem usar. É que parece haver uma tremenda confusão, na cabeça destas pessoas, entre gerir os recursos humanos e mandar, nos mesmos, como se de patrões se tratassem.
Os srs diretores que se encaixam neste perfi do "quero posso e mando", têm procedimentos à margem da lei, e, são no mínimo patéticos.
Muito triste esta situação para a colega Prof. Anabela Magalhães.

Fátima Inácio Gomes disse...

Bravo. Bravíssima! sinto uma profunda admiração.

Anabela Magalhães disse...

Muito grata a todos pelo vosso carinho. A luta continua.

Unknown disse...

Um(a) amigo(a) não se esconde no anonimato.

Unknown disse...

Apoio anónimo é covardia.

Unknown disse...

Até aposentado tem medo de dar apoio de forma expressa?

 
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