"É a melhor notícia que o país podia receber nesta altura: o pai de todos os males está a diminuir de intensidade, o Belzebu que nos lixou a vidinha está a ser destruído. Sim, é verdade, o défice externo está a baixar a uma velocidade notável. Basta pensar que no quarto trimestre de 2011, Portugal registou um saldo externo positivo, isto é, o guito gerado pela exportações superou o guito consumido nas importações. Em termos gerais, o défice externou baixou 41% entre 2010 e 2011, uma redução que se deve à necessária quebra do consumo de importações (-5,5%) e à força das nossas empresas exportadoras (+7,4%), as tais empresas que são mesmo empresas e não monopólios defendidos pelo Poder. Os números conhecidos deste ano parecem confirmar a tendência.
Este dado é per se a coisinha mais importante que podia acontecer a Portugal no curto prazo, porque, como já foi explicado 3456 vezes, o défice externo é o primeiro e decisivo vício da sociedade portuguesa. Mas este dado vai além do curto prazo. Numa visão de longo prazo, há aqui uma tendência muito interessante e benigna. A mighty Cristina Casalinho explica: no passado, Portugal conseguiu alcançar saldo positivo com o exterior em dois períodos, mas só alcançou esse feito com a ajuda das remessas dos emigrantes (1966-1974) e da desvalorização do Escudo (1985-88). Ou seja, 2012 parece mesmo inaugurar uma nova fase da sociedade portuguesa, que está prestes a conseguir um saldo positivo com o exterior sem a ajuda das remessas e sem a muleta chico-esperta do Escudo baixinho. Peço desculpa, mas não podia haver notícia melhor para Portugal. Sem uma balança de pagamentos equilibrada ou com saldo positivo, nós não vamos a lado nenhum e estaremos sempre dependentes das poupanças-externas-que-nos-emprestam-dinheiro (vulgo: mercados).
O que surpreende neste ponto não é a capacidade de adaptação da sociedade portuguesa. Não surpreende o realismo dos portugueses, sobretudo na forma como voltaram a poupar, e não surpreende a garra das empresas exportadoras. O que surpreende é o silêncio político e mediático em redor deste assunto. Ante este apagão, um sujeito até fica constrangido, "olhem, peço desculpa, mas está aqui um facto importante, aliás, não podia ser mais importante, e até é positivo para a malta". As redacções, sempre neorealistas, remetem o assunto para notas de rodapé. E o governo ainda não explicou aos portugueses a importância deste facto, que nem sequer é difícil de perceber. Quando mata um Belzebu, o Leviatã tem de comunicar a caçada aos cidadãos. Vem nos livros.
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