Vida de Cão - Lisboa - Portugal
Fotografia de Anabela Matias de Magalhães
Querida Grécia,
escrevo esta carta sem ser segundo as regras do novo acordo ortográfico porque sei que vocês também gostam de não respeitar as regras.
Ia a escrever - espero que estejam todos bem -, mas também cá tivemos a troika.
Se lhe escrevo, Querida Grécia, é por uma razão muito simples. Não, não venho cobrar nada. Espero que não tenha enviado esta carta para o lixo. Juro que não sou familiar do Duarte Marques, nem conheço quem seja e assuma.
Escrevo-lhe para pedir desculpa pelo nosso Presidente, pelo nosso Governo e por um sujeito de pavilhões auriculares extensíveis que trabalha para a televisão do Estado. Sei que o que peço é demasiado. Sei que não me pode perdoar tudo, mas podemos negociar.
Penso, Querida Grécia, que serão sensíveis aos nossos argumentos, tendo em conta o sofrimento a que o nosso povo tem estado sujeito.
Queria começar por lhe pedir desculpa pelo nosso primeiro-ministro. Não. Esse é o Paulo Portas. O nosso primeiro-ministro é o alto. Um que caminha a passos largos para ser como o vosso Varoufakis; infelizmente, só a nível capilar.
Gostava muito que nos perdoasse, pelo menos, metade das coisas horríveis que o nosso PM tem dito sobre si. Mas se acha que as declarações do nosso PM ofendem a sua pátria, lembre-se que ele usa um pin com a nossa bandeira. Como é que acha que nós nos sentimos?! Se ele não usasse o maldito pin, talvez passasse por PM da Baviera e não tínhamos de sofrer tanta vergonha.
Quanto ao nosso Presidente, eu podia usar a desculpa de que ele já não está em condições, mas não quero enganar ninguém. Ele sempre foi assim. É uma pessoa horrível, mas somos nós que temos de viver com ele desde pequeninos, Querida Grécia.
Veja que, por exemplo, quando o nosso Presidente da República diz: "Muitos milhões de euros estão a ser tirados dos bolsos dos portugueses para a Grécia", e diz com os dentes todos para percebermos melhor a brutalidade da quantia - "miiiil e cem miiiil milhões" -, é óbvio que é muito ofensivo para vocês. Mas acredite, Querida Grécia, é muito mais ofensivo para nós. Imagine o nosso sofrimento, que ouvimos isto, e tivemos de nos juntar para pagar umas seis vezes mais, com o banco feito por ex-colegas do nosso Presidente. E, Querida Grécia, nunca o vimos vir a público dizer - "saíram seis miiiiiil miiiiiilhões de euros do bolso dos portugueses para o BPN". Ou: "Ganhei umas centenas de miiiiiiiiilhares de euros no BPN que acabaram por sair do bolso dos portugueses".
Por isso peço, Querida Grécia, que nos perdoe pelo menos 80% dos disparates que o nosso Presidente diz. O resto, não peço que nos desculpe. Espero que esqueça com o tempo. Prometo que vamos tentar esquecê-lo primeiro.
Com os melhores cumprimentos,
João Quadros
P.S.: Pare de me enviar iogurtes, Querida Grécia. Sou lacto-intolerante e isso não é negociável.
Nota - Subscrevo a carta na sua totalidade. E encontrei-a via Guinote.
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