domingo, 10 de outubro de 2010

Apanhar Gravetos e Pinhas


Recolecção - Serra da Aboboreira - Amarante
Fotografia de Anabela Matias de Magalhães

Apanhar Gravetos e Pinhas

Poder-se-ia pensar que a necessidade aguça o engenho e que essa é a explicação para eu ter passado a tarde a apanhar gravetos e pinhas na Aboboreira, gravetos e pinhas que, por certo, me serão úteis para acender a lareira, evitando assim comprar acendalhas, e que contribuirão para o meu aquecimento nos dias de Inverno, que se aproximam a passos largos, tal como fazem as mulheres por todo o mundo rural marroquino, e que se cruzam comigo dobradas sob o peso da lenha fina que lhes cozerá a massa que, sob a sua acção, se transformará no fabuloso pão árabe e berbere que por todo o lado se pode degustar e que é de comer e chorar por mais.
Só que a razão não é verdadeiramente esta, e nem sequer apanho os gravetos e pinhas para mim, que não acendo uma lareira há anos e não pretendo voltar a acendê-la tão cedo, e que, assim sendo, não necessito deles para nada.
Apanho-os simplesmente porque sou recolectora e na serra vou monte acima, monte abaixo, juntando montinhos de gravetos e pinhas que durante muitos anos dei a amigos e familiares que apareciam na Barca e que agora apanho para os Jotas que deles necessitarão não tarda nada.
Apanhar gravetos e pinhas, numa tarde soalheira de Outubro, é uma actividade fantástica de manutenção da saúde física e mental. Passo sim, passo sim, lá estou eu dobrada em direcção ao chão a apanhar as pinhas e os galhos caídos no chão sob acção do vento que lá se vai encarregando, naturalmente, de se livrar da matéria morta. Por vezes ajudo os carvalhos e trepo pelos seus troncos acima e de serrote em punho ataco-os, fazendo tombar os galhos mortos pelo chão. Com paciência, corto aquilo tudo em bocados pequenos, obtendo um produto final de primeira, obtendo uns gravetos de primeiríssima qualidade que, com mais umas pinhas dos meus pinheiros de estimação, serão os responsáveis por muitas noites aconchegadas dos Jotas durante o próximo Inverno.
É uma das actividades a que chamo dois em um - se por um lado faço exercício físico numa paisagem soberba, por outro faço uma desintoxicação de políticas e políticos da treta que me desagradam ao nível do vómito e que, durante a prática desta actividade, nem são lembrados, poupando eu, desta forma, umas consultas valentes de psiquiatria.
Esta actividade, praticada desde o domínio do fogo e posterior invenção do seu fabrico, chegou aos nossos dias e continua a ser praticada em muitos pontos do Globo, contribuindo a sua prática para a manutenção de uma floresta mais limpa, mais saudável e mais resistente. Esta actividade faz parte das minhas memórias de infância e de adolescência quando me deslocava pelas aldeias dos arredores de Amarante e era praticada com regularidade, complementando assim os aldeões os seus magros rendimentos.
Já não se pratica. A prova disto é que os montes estão infectos de matéria combustível que durante as canículas de Verão arde imparável e descontroladamente, assustando populações mais ou menos indefesas.
Apanhar gravetos e pinhas caiu em desuso e só não sei se definitivamente. Face às dificuldades sentidas assistiremos a um retorno às velhas práticas económica e ambientalmente mais sustentáveis?

2 comentários:

laura Marques disse...

Só agora vi o teu post. Na verdade, continuo a apanhar pinhas com as minhas filhotas e, tal como tu, continuo a amar essa actividade. Já ocupei desta forma divertida e saudável duas tardes de domingo de Setembro. E daqui a uns tempos será mais fácil acender a minha lareira que adoro ver acesa no Inverno...
Xi coração

Anabela Magalhães disse...

Linda menina! E assim ajudamos a prevenir os incêndios! Excelente actividade para uma soalheira tarde de outono, não é? Este também não foi o meu primeiro da temporada... talves o quinto... kakakakaka
Beijocas, Linda! Temos encontro na quinta? Para o café?

 
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